Revista de Pediatria SOPERJ

ISSN 1676-1014 | e-ISSN 2595-1769

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Número atual: 14(1) - Outubro 2013

Artigos de Revisao

Tuberculose osteoarticular em criança: relato de caso

Osteoarticular tuberculosis in children - a case report

 

Carlos Podalirio Borges de Almeida1; Denise Rossato Silva2

1. Mestre (Professor)
2. Doutor (Professor Adjunto de Pneumologia UFRGS)

 

Endereço para correspondência:

p>Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Rua José do Patrocínio nº 111, apto. 21,90500-000
Porto Alegre-RS
Tel.: (51) 9578-5611
carlosalmeida1410@hotmail.com

 

Resumo

O objetivo deste estudo foi descrever um caso de tuberculose osteoarticular em criança. Menino com oito anos, há um ano teve queda de uma árvore, há sete meses iniciou com queixas de dor nas costas e dificuldade para deambular. Teste tuberculínico reator fraco, anti-HIV não reagente, pesquisa para BAAR positiva do abcesso paravertebral de T12, anti-HCV não reagente. Os exames de imagem indicam fratura da vértebra com colapso do corpo vertebral de T12, espessamento de partes moles paravertebrais bilateralmente, compatível com espondilodiscite com abscesso paravertebral anterior associado. Iniciou tratamento para tuberculose osteoarticular com rifampicina, isoniazida e pirazinamida. O paciente fez hepatite medicamentosa e reiniciou as medicações uma a uma. Atualmente está sem queixas de dor. Pelo seu prognóstico e capacidade de ser confundida com outras patologias a tuberculose osteoarticular impõe-se como um importante diagnóstico diferencial de outras doenças.

Palavras-chave: Tuberculose osteoarticular, Infecçao, Criança.


Abstract

The aim of this study was to describe a case of osteoarticular tuberculosis in children. Boy eight years old, a year ago had a falling tree, seven months ago began complaining of back pain and difficulty in walking. Tuberculin skin test reactor weak anti-HIV non-reactive, search for AFB positive paraspinal abscess from T12, anti-HCV non-reactive. Imaging studies indicate fracture of the vertebra with collapse of the T12 vertebral body, paraspinal soft tissue thickening bilaterally, compatible with spondylodiscitis with paraspinal abscess associated earlier. Began osteoarticular tuberculosis treatment with rifampicin, isoniazid and pyrazinamide. The patient had drug-induced hepatitis and restarted the medications one by one. He is currently without complaints of pain. For his prognosis and ability to be mistaken for other diseases osteoarticular tuberculosis imposes itself as an important differential diagnosis of other diseases

Keywords: osteoarticular tuberculosis, Infection, Child.

 

INTRODUÇÃO

Um terço da população mundial, correspondendo a aproximadamente dois bilhões de pessoas, encontra-se infectada pelo Mycobacterium tuberculosis e, dentre eles, oito a nove milhões desenvolvem a tuberculose (TB)(1).

O Brasil está em 22º entre os 22 países com maior incidência notificada de TB, apresentando uma incidência de 37,7 casos/ 100.000 habitantes em 2010(2). Porto Alegre registrou em 2010 uma incidência de TB de 108,3 casos/100.000 habitantes, sendo a capital do país com a maior incidência de TB(3). No ano de 2010, foram notificados 2066 casos novos de TB no município(4).

Cerca de 10% dos casos clínicos de tuberculose acometem o osso. Em São Paulo a incidência de TB Osteoarticular em menores de 15 anos situa-se em aproximadamente 2%(5). A tuberculose vertebral é a mais frequente e representa cerca de metade dos casos de tuberculose osteoarticular(6). O objetivo deste estudo é a descrição de um caso com manifestações clínicas e achados microbiológicos e de imagem de Tuberculose Osteoarticular em uma criança.

 

RELATO DO CASO

Paciente do sexo masculino, oito anos de idade, de cor parda, estudante, brasileiro, residente em Porto Alegre (RS), compareceu ao setor de Tisiologia do Centro de Saúde Modelo para tratamento de TB. Relatou juntamente com sua mãe que, há um ano teve queda de uma árvore e há sete meses iniciou com queixas de dores nas costas e dificuldade para deambular. A dor inicialmente era leve e intermitente, localizada na região da coluna torácica e não limitava suas atividades diárias. Em cerca de 120 dias antecedentes à avaliação, houve aumento da intensidade da dor. Possuía uma dose da vacina BCG e cicatriz no braço direito. Durante o exame físico eram evidentes os graus elevados de escoliose e cifose. Foram realizados alguns exames: teste tuberculínico, resultado: reator fraco (7mm); anti-HIV: não reagente; pesquisa para Bácilo Álcool-Ácido Resistente do abcesso paravertebral de T12: positiva; anti-HCV: não reagente; valor de sedimentação globular: 63mm; Proteína C Reativa: 20,50 mg/L; Raio-X de tórax/coluna dorsal/coluna lombar: fratura da vértebra com colapso do corpo vertebral de T12, espessamento de partes moles paravertebrais bilateralmente, sem lesões ósseas associadas aos arcos costais direito e esquerdo; Ressonância Magnética Nuclear: fratura com acunhamento do corpo vertebral de T12, notando-se irregularidade nos platôs dos corpos de T11 e de T12, com grande coleção heterogênea associada, compatível com espondilodiscite com abscesso paravertebral anterior associado com 7,0cm de extensão longitudinal e há compressão de medula neste nível, porém, mantendo espessura e sinais normais.

Considerando-se o quadro clínico, exames laboratoriais, as características das imagens encontradas na ressonância nuclear magnética e tomografia computadorizada, e os achados histopatológicos, decidiu-se iniciar o esquema tríplice para TB óssea (Isoniazida, Rifampicina e Pirazinamida). Iniciou tratamento para TB, após 15 dias iniciado o tratamento, paciente evoluiu com hepatite medicamentosa, diagnosticado pela história clínica e reiniciou as medicações uma a uma. Atualmente está sem queixas de dor.

Após dois meses de tratamento, o paciente apresentava melhora clínica evidente e foi mensalmente reavaliado na unidade de referência para TB. No terceiro mês de tratamento para TB, o paciente começou a usar colete ortopédico por indicação do ortopedista, devido ao grau elevado de escoliose e cifose decorrentes da TB Osteoarticular. A terapia foi realizada por seis meses e houve ótima evolução do quadro geral. No último mês do esquema terapêutico, não mais apresentava dor e sua função motora estava plenamente recuperada. Entretanto, apresentava desvio dextroconvexo da coluna tóraco-lombar e acentuação da lordose lombar.

 

COMENTÁRIOS

Dentre as deformidades encontradas na coluna, destacaram-se a escoliose dextroconvexa e a hipercifose. A cifose ocorre com mais frequência nos casos em que a área envolvida compreende a coluna torácica baixa e a transição toracolombar. São mais comuns no diagnóstico tardio(6,7,8).

A espondilodiscite tuberculosa pode acometer um ou mais segmentos da coluna vertebral, podendo levar a deformidades (mal de Pott), e como resultados há a cifose, a escoliose e o aumento de volume local. Em grau maior, a deformação e o colapso vertebral podem afetar a medula espinal, com consequente alteração da deambulação como no caso relatado(8).

O tratamento desta patologia permanece controverso. Estudos divergem quanto ao tempo de antibioticoterapia (6, 9 e 12 meses) e ao tipo de tratamento a ser considerado, antibioticoterapia ou cirurgia, a comparação entre os tipos de terapêutica não teve diferença significamente estatística. A drenagem de abscessos e a curetagem dos fragmentos ósseos e de disco sequestrados seguida da colocação de órteses podem levar ao agravamento da cifose(9,10).

No atendimento pediátrico, as dores no dorso geralmente têm outras causas. No entanto, outras possibilidades mais raras, como a TB osteoarticular, devem ser lembradas no diferencial, sendo os pré-escolares os mais acometidos(6,8).

Pelo seu prognóstico e capacidade de ser confundida com outras patologias a TB Osteoarticular impõe-se como um importante diagnóstico diferencial de outras doenças. Ressaltamos que é necessário levantar a suspeita diagnóstica de TB em todos os pacientes pediátricos que apresentarem dores no dorso, dificuldade de deambulação e artralgias.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Hino P, Santos CB, Villa TCS, et al. O controle da tuberculose na perspectiva da Vigilância da Saúde. Esc. Anna Nery. 2011, pp. 417- 421.

2. World Health Organization. Global Tuberculosis Control. Report 2010: Epidemiology, Strategy , Financing. Disponível em: www.who.int. Acesso em: Novembro, 2012.

3. Ministério da Saúde. Programa Nacional de Controle da Tuberculose. 2011. Disponível em: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/2site_31_05_2011.pdf. Acesso em: Novembro 2012.

4. Prefeitura Municipal de Porto Alegre. Boletim Epidemiológico. Porto Alegre, Brasil,2009. http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/sms/usu_doc/boletim_epid_40.pdf Acessed September 10, 2009

5. Arcelis RRM, Marques HHS, Matielo RLB, et. al. Tuberculose Osteoarticular em Crianças. Pediatria. 2006. Vol. 28, n.3, pp. 169-74.

6. Medeiros RS, Abdo RTC, Paula FC, et al. Tratamento da tuberculose da coluna vertebral: conservador ou cirúrgico?.Acta. ortop. bras. 2007, vol.15, n.3, pp. 128-31.

7. Khoo LT, Mikawa K, Fessler RG. A surgical revisitation of Pott distemper of the spine. Spine J 2003;3:130-45.

8. Harvey ELT, Wilfred CGP. Skeletal tuberculosis in children. Pediatr Radiol 2004;34:853-60.

9. Bailey HL, Gabriel SM, Hodgson AR, et. al. Tuberculosis of the spine in children. 1972. Clin. Orthop. Relat. Res. 2002; pp. 4-18.

10. Moon M, Moon Y, Moon J, et. al. Conservative treatment of tuberculosis of the lumbar and lumbo sacral spine. Clin. Orthop. Relat. Res. 2002; pp. 40- 9.