Revista de Pediatria SOPERJ

ISSN 1676-1014 | e-ISSN 2595-1769

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Número atual: 21(4) - Dezembro 2021

Artigo de Revisao

Benefícios e segurança do uso de dispositivos acessórios para a extração de leite: revisão da literatura

Benefits and safety of the use of devices accessories to milk extraction: literature review

 

Helena Ritter De Abreu; Alexandre Antonio Naujorks

 

DOI:10.31365/issn.2595-1769.v21i4p199-205

Universidade Franciscana, mestrado profissional de saúde materno infantil - SANTA MARIA - RS - Brasil

 

Endereço para correspondência:

helaabreu@hotmail.com

Recebido em: 27/04/2021

Aprovado em: 29/06/2021


Instituição: Universidade Franciscana, mestrado profissional de saúde materno infantil - SANTA MARIA - RS - Brasil

 

Resumo

INTRODUÇÃO: As boas práticas de amamentação em atenção ao binômio mãe-bebê referem-se à amamentação exclusiva nos seis primeiros meses e continuada até os dois anos de idade, em conformidade com a Organização Mundial da Saúde. Ocorrendo a necessidade de ordenha da mama, devido a múltiplas intercorrências clínicas, teremos disponíveis para o benefício da prática dispositivos auxiliares à lactação e protetores da mama, primordiais para evitar o desmame precoce.
OBJETIVO: Revisão narrativa sobre os métodos utilizados para a extração de leite humano e o uso de dispositivos utilizados no período de amamentação exclusiva.
MÉTODO: Revisão da literatura sobre "evidências de benefícios e segurança para utilização de dispositivos acessórios à extração do leite" com coleta de dados nas bases virtuais BVS, Medline, Scopus, Science Direct e Cochrane, com os descritores "aleitamento materno", "extração de leite materno" e "leite humano" com recorde temporal dos últimos 20 anos de publicação.
RESULTADO: O uso de dispositivos acessórios para a amamentação é popular e de boa aceitabilidade, relativamente seguro, porém não determina benefícios inequívocos em relação a prolongar o período de amamentação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS: Os diferentes métodos auxiliares à extração de leite e os protetores de mama consistem em dispositivos acessíveis no seu manuseio e de custo variado. As tecnologias educacionais, gerenciais e assistenciais direcionadas ao aleitamento materno devem valorizar esses dispositivos auxiliares, quando se fizerem necessários, evitando o desmame precoce.

Palavras-chave: Leite Humano. Extração de Leite. Aleitamento Materno.


Abstract

INTRODUCTION: Good breastfeeding practices in attention to the mother-baby binomial refer to the exclusive breastfeeding for the first six months and appropriate up to two years of age according to the World Health Organization. Due to multiple clinical complications breast milking is needed, so we will have available for the benefit of the practice auxiliary devices to lactation and breast protectors, essential to avoid early weaning.
PURPOSE: Narrative review based on the methods used for the extraction of human milk and the use of devices used in the period of exclusive breastfeeding.
METHODS: Literature review on "evidence of benefits and safety for the use of devices which are accessory to the milk extraction" with data collection in the VHL virtual databases, Medline, Scopus, Science Direct and Cochrane with the keywords "breastfeeding", "breast milk extraction", " human milk" and time record of the last 20 years of publication.
RESULTS: The use of the accessory devices for breastfeeding is popular and of good acceptability, relatively safe but does not determine unequivocal benefits in relation to prolonging the breastfeeding period.
FINAL CONSIDERATIONS: The description of different auxiliary methods for human milk extraction and breast protectors consist of accessible devices in their handling and of varying cost. Educational, managerial and assistance technologies aimed at breastfeeding should enhance these auxiliary devices, when necessary, avoiding early weaning.

Keywords: Milk, Human. Breast Feeding. Milk Ejection.

 

INTRODUÇÃO

No processo de amamentação, fatores positivos interdependentes compõem o programa de atenção básica para o êxito da amamentação exclusiva e complementada no período puerperal. A maioria das tecnologias em saúde pública aplicadas na promoção do aleitamento refere-se às educacionais, gerenciais e assistenciais.1 Para facilitar a técnica natural da saída do leite, existem acessórios auxiliares para o enfrentamento das intercorrências do período puerperal, como mastite, ingurgitamento mamário, mamilo plano e invertido, desconforto, dor, fissuras mamilares e outras intercorrências, principalmente nos primeiros dias do aleitamento.

A lesão mamilar é considerada uma causa comum de abandono da amamentação.2 A separação do binômio mãe-bebês prematuros, principalmente devido à necessidade de internações hospitalares e o retorno às atividades profissionais comprometem seriamente a frequência e o tempo das mamadas. Assim, o uso de dispositivos auxiliares à extração de leite, tanto em instituições de saúde como no domicílio, torna-se fundamental para evitar o desmame precoce. Dispositivos foram desenvolvidos para facilitar o processo de extração e estocagem do leite humano, tais como máquinas de sucção para retirada de leite. A proteção física do mamilo, as conchas mamárias, os protetores de silicone ou "mamilos intermediários" foram desenvolvidos para beneficiar a amamentação, sendo de uso frequente nas mais diversas intercorrências e desfechos clínicos.

Esta revisão objetiva discutir a utilidade dos dispositivos acessórios para a extração de leite e as bases científicas disponíveis relacionadas ao benefício e segurança desses dispositivos auxiliares. As informações devem ser úteis na prática assistencial, visando manter o aleitamento com segurança e conforto para o binômio, em diferentes cenários e contextos.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Trata-se de revisão da literatura sobre o tema "evidências de benefícios e segurança para utilização de dispositivos acessórios à extração de leite". Para guiar a pesquisa, formulou-se a seguinte questão: "o que foi produzido na literatura que forneça evidências para utilização de dispositivos acessórios para extração de leite humano".

A coleta de dados foi realizada nas seguintes bibliotecas virtuais de dados da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), da Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos da América (Medline), na biblioteca eletrônica Science Direct e na biblioteca Cochrane de revisões sistemáticas. Foram utilizados os descritores: "aleitamento materno" ("breastfeeding"; "lactancia materna"),"extração de leite" ("breast pumping"; "extracción de leche materna") e "leite humano" ("human milk"). Foi estabelecido um recorte temporal dos últimos 20 anos da publicação.

Os critérios de inclusão dos estudos foram: pesquisas que abordassem a temática, publicadas nos idiomas português, inglês ou espanhol, em formato de artigo, inéditos, oriundos de pesquisas científicas originais ou revisões da literatura e que apresentassem o trabalho completo na íntegra e disponível on-line. Os critérios de exclusão foram: trabalhos que não apresentassem resumos na íntegra na base de dados e nas bibliotecas pesquisadas, em formato de teses, dissertações. A busca foi realizada de forma ordenada na BVS, Medline, Scopus, Science Direct e Cochrane. Assim, as publicações que se encontravam indexadas em mais de uma delas foram selecionadas na primeira busca onde era disponível.

Foram encontrados no total 1.230 referências nas pesquisas realizadas. Destas, foram excluídas as publicações duplicadas (n=813) e então analisados os resumos de 417 publicações, a fim de apurar se atenderiam aos critérios de inclusão e responderiam à questão norteadora do estudo. Posteriormente à leitura dos títulos, foram excluídos 201 artigos e após a leitura dos resumos, foram excluídos mais 174 artigos, sendo a leitura na íntegra de 42 artigos. Foram selecionadas 20 publicações que atenderam aos critérios de inclusão e responderam à questão dessa revisão, conforme detalhado na figura 1. Portanto, seus resultados estão contemplados indiretamente e assim foram excluídos dos artigos utilizados para a revisão final.

 


Figura 1. Fluxograma da seleção das publicações

 

RESULTADOS

A apresentação dos resultados e a discussão sobre evidências para utilização de dispositivos acessórios para extração de leite foram elaboradas de forma descritiva e separadas conforme o tipo de dispositivo ou máquinas de extração, e revisão do uso de protetores mamários (conchas e mamilos intermediários), possibilitando a avaliação da aplicabilidade direta do estudo no contexto assistencial para o estímulo da amamentação.

Máquinas de extração

Os dispositivos ou máquinas de extração de leite (comumente chamados "bombas" de extração) são equipamentos, de ativação elétrica ou manual, que possuem uma válvula que possibilita a sucção da mama e armazenamento do leite. Um coletor é posicionado sobre a mama, de modo que o mamilo fique no centro deste coletor e ligado a um sistema fechado com ativação criando vácuo e sucção. Esses produtos são industrializados e adquiridos sem prescrição médica. As bombas manuais são menos dispendiosas e apresentam a característica de serem silenciosas, fáceis de armazenar, transportar e independem de disponibilidade de eletricidade ou bateria. Porém, o efeito de bombeamento é mais lento e com menor potência de vácuo-sucção, exigindo maior tempo no processo. As bombas que utilizam bateria ou eletricidade têm maior poder de vácuo-sucção, reguláveis eletronicamente, gerando uma pressão de sucção de até -270 mmHg, comparativamente maior que a pressão de sucção de um RN a termo (-50 a -197 mmHg).3

Os acessórios "sutiãs" ou "bustiers" são coletores acoplados a uma bomba elétrica com bateria permitindo um processo de sucção contínua com possibilidade de movimentação da mãe e a liberação das mãos, podendo serem utilizadas nas duas mamas simultaneamente, tornando o produto com maior quantidade de leite em menor tempo. Contudo, são mais dispendiosas e consequentemente menos acessíveis no uso domiciliar.3

Alguns modelos são comercialmente disponíveis em diversos designs e sistemas funcionais. O material deve ser esterilizável, e a cada uso separar as partes para lavagem dos resíduos. Os fabricantes relatam benefícios práticos do uso das máquinas extratoras e são também citadas nas revisões científicas sobre o tema:

• esvaziamento da mama intumescida, aliviando ao ingurgitamento devido ao bloqueio do "reflexo apócrino";

• permitir à mãe o início da lactação quando o recém-nascido (RN) não estiver apto a mamar diretamente na mama, possibilitando maior produção de volume de leite dentro da primeira semana pós-parto;

• permitir estocagem e administração do leite materno por cuidadoras do bebê, quando a mãe estiver ausente por períodos prolongados;

• auxílio na amamentação de bebês prematuros, em que fatores como separação da mãe, sucção fraca por incapacidade muscular, infecções, comprometimento neurológico, malformações do trato aerodigestivo, intervenções para suporte ventilatório durante período de internação em centros intensivos de neonatologia, impossibilitem a amamentação natural. Esses dispositivos seriam então importantes auxiliares para garantir a lactação;

• aumento na produção de leite para gemelares;

• fornecimento de leite a outros RNs;

• estabelecimento de lactação para bebês adotados;

• preferência/impossibilidade materna de não amamentar na mama;

• mamilos planos e invertidos (o sistema de sucção deixa os mamilos mais salientes);

• maior volume de leite em relação à extração sem o equipamento;

• retorno ao trabalho da puérpera, permitindo à mãe estoque de leite e manutenção do reflexo de produção da lactação;

• redução da incidência de mastite puerperal e dor associada;

• infecções maternas que oferecem risco de contaminação do bebê pela amamentação, que podem exigir a extração e pasteurização do leite materno, para evitar a transmissão viral e manter o aporte nutricional necessário.4

Em situações de internação hospitalar do bebê, prematuro ou com outra condição clínica grave, a Rede Global de Bancos de Leite Humano (rBLH) orienta norma para coleta de leite da própria mãe e assim ofertar o melhor alimento para o RN enfermo, auxiliando em sua recuperação e favorecendo a manutenção da amamentação.1 Bombas extratoras manuais como pera de borracha não são recomendadas, devido à dificuldade de higienização e esterilização pela face interna da pera. Os outros tipos de bombas podem ser utilizados, segundo esta norma técnica. O profissional de saúde deve disponibilizar a bomba extratora manual ou elétrica, com acoplador e recipiente de armazenamento estéreis. Este recipiente deve ser de "material inerte e inócuo, estéril com boca larga e tampa de plástico rosqueável que possibilite o fechamento perfeito, de fácil higienização, resistente ao processo de esterilização, de volume compatível com a produção láctea materna e rótulo a ser preenchido".5

Com essas expectativas de benefício, as bombas extratoras tornaram-se populares e alguns estudos indicam que em torno de 85% das mulheres americanas extraem leite nos primeiros meses pós-parto com máquinas de bombeamento, principalmente as primíparas.4

Para que ocorra indicação de rotina dessas máquinas pelas equipes de assistência à saúde da mãe e do bebê, seria necessário haver uma produção científica mais consistente. Os estudos disponíveis são metodologicamente muito heterogêneos e altamente discrepantes em relação ao efeito das máquinas de extração sobre a duração da amamentação.

Achados desfavoráveis ao uso das máquinas de extração ocorreram no estudo de Schwartz et al. em mulheres do Meio-Oeste norte-americano. Os autores constataram que a utilização de bombas extratoras nas primeiras três semanas do pós-parto aumentou o risco de interrupção da amamentação, mesmo sem intercorrências clínicas. Após três semanas do parto, entretanto, a extração manual reduziu o risco de desmame precoce.6

Por outro lado, acompanhando durante 52 semanas numa coorte de 587 mães australianas, Win et al. observaram menor probabilidade de descontinuar a amamentação entre as que utilizaram máquina de extração em algum momento pós-parto, quando comparadas a mulheres que nunca as utilizaram, com risco relativo de 0.71 (IC 95% - 0.52-0.98).7 E ao contrário, outro estudo de 59 mulheres durante as primeiras quatro semanas pós-parto não encontrou associação entre a utilização de dispositivos extratores e a duração da amamentação natural.8

Em um estudo da China, foram fornecidos dois tipos diferentes de bombas extratoras, sem influência significativa nas práticas de amamentação, mas com menor percentual de amamentação exclusiva.9

Muito importante é a comparação entre os diferentes métodos de extração de leite materno (manual ou bomba manual, elétrica e/ou bateria) em diferentes cenários e relacionados a desfechos como: volume do leite extraído; duração da amamentação exclusiva ou suplementada; aceitabilidade pela mãe; acessibilidade e capacidade de aquisição dos dispositivos; efeitos benéficos ou adversos sobre a mama; alteração da composição ou contaminação do leite. Assim, desde 1982, existem vários trabalhos comparando as técnicas de extração com duas revisões qualificadas e de leitura recomendada.

A primeira é a revisão do tipo "estado da arte" elaborada por Valerie J. Flaherman e Henry C. Lee, médicos pediatras das Universidades da California e da Escola de Medicina da Universidade Stanford, ambas do estado da California nos Estados Unidos da América.4 Os autores resumem os achados dos principais ensaios clínicos randomizados, tanto de mães de RNs prematuros hospitalizados quanto de mães que desejam retornar às atividades de trabalho ou escola. Assim, relatam que a maioria dos estudos demonstram que as bombas extratoras bilaterais extraem mais leite em menor tempo que bombas unilaterais, bombas manuais ou compressão manual das mamas. Por isso, foi o método de primeira escolha das mães avaliadas na maioria dos estudos. Contudo, existem preferências individuais para todos os métodos, uma vez que muitas mulheres são capazes de extrair volumes adequados de leite usando qualquer um dos métodos. Além disso, embora as bombas elétricas pareçam ter melhor eficácia e eficiência em relação a extração manual, essa diferença não significa ter resultado na duração da amamentação.4

A segunda revisão recomendada é na base Cochrane de revisões sistemáticas. A revisão "Methods of milk expression for lactating women" foi inicialmente publicada em 2008 e atualizada em 2011 e 2015. 10 A atualização selecionou 41 ensaios clínicos randomizados, envolvendo 2293 participantes, de 14 países e publicados entre 1982 e 2015. Os autores relataram uma grande heterogeneidade dos participantes, das intervenções e dos desfechos e metade dos estudos financiados por fabricantes das máquinas de extração. Assim, alertam para os evidentes viéses na interpretação dos resultados.

De qualquer modo, esta revisão indicou que nenhum método de bomba extratora isoladamente aumentou consistentemente o volume de leite obtido. Por outro lado, quando outras intervenções foram associadas ao uso das máquinas parece ter ocorrido aumento de maneira clinicamente significativa na quantidade de leite (relaxamento, música, calor nas mamas, massagem, tamanho adequado das partes dos equipamentos e acessórios em relação ao volume da mama). Programas de suporte educacional também não indicaram diferença no volume de leite obtido. Uso de máquina bilateral simultaneamente ou sequencialmente nas mamas também não indicou diferença significativa.10

Relativamente à qualidade nutricional do leite, os estudos indicaram maior quantidade de proteínas quando da maior utilização das bombas extratoras comparativamente às bombas manuais. A extração manual forneceu leite com maior conteúdo de sódio e menor conteúdo de potássio, além de maior conteúdo de gordura, comparativamente às bombas extratoras ou manuais. Não houve diferença no conteúdo energético do leite obtido.10

Há divergências na literatura sobre a liberação dos hormônios da lactação durante o uso destes dispositivos auxiliares à extração de leite, necessitando de mais estudos para definir se a produção de prolactina e ocitocina ocorrem em níveis adequados durante o uso destes dispositivos semelhante aos encontrados durante a sucção do lactente, chamados hormônios da lactação.

Com relação à segurança, não houve diferença significativa entre os métodos em relação à contaminação do leite, não ficando comprovado de que o uso de dispositivos contaminasse o leite. O nível de dor na mama e/ou mamilo ou ferimentos como fissuras foi semelhante entre os diferentes métodos. Em geral, os estudos apontaram em torno de 7% de desconforto nos mamilos tanto com o uso de BE ou de EM. Em um dos estudos com uso de BE foi observado ingurgitamento mamário em 6% e com bomba manual 4%.10

A revisão Cochrane deixa a impressão de que lesões do mamilo foram raramente relatadas tanto para uso de bombas extratoras ou manuais, ao contrário das informações previamente disponíveis.11,12 Entretanto, em vários outros estudos existem relatos de complicações associadas ao uso das bombas de sucção, na grande maioria dos casos de desconforto ou dor na mama durante a sucção.11 Efeitos mais importantes, como fissura mamilar e irritação areolar, são mais comuns com as bombas extratoras e eventualmente exigem intervenção médica por danos ao tecido mamário. Contaminação do leite materno durante o bombeamento também é relatado, especialmente relacionado à limpeza inadequada do dispositivo. Mastite é mais raramente associada ao uso destes dispositivos.13

Um interessante estudo sobre o efeito mecânico do uso de bombas extratoras nas mamas encontrou significativa correlação deste uso com maior diâmetro e comprimento mamilar em relação à extração manual. E uso de bomba extratora foi correlacionado a maior sensação dolorosa e sinais inflamatórios locais.14

Conchas de Amamentação

As conchas de amamentação são materiais inorgânicos geralmente maleáveis de silicone esterilizáveis, utilizados ao redor das mamas, por baixo do sutiã. Consistem em armazenar o leite que extravasa entre uma mamada e outra, assim evitando o contato direto do complexo areolo-mamilar no sutiã ou nas vestimentas. Auxiliam no alívio da dor mamária, na prevenção de rachaduras e contribuem na cicatrização dos mamilos traumatizados. Têm função basicamente protetiva para o mamilo, uma vez que o leite armazenado na concha não deve ser oferecido ao lactente.15 Comercialmente disponíveis em diferentes designs, com formato côncavo da parte coletora, podem variar em relação à base e ao tamanho do orifício na base. Mulheres com mamas menores e/ou mamilos invertidos beneficiam-se das conchas com base rígida e orifício menor. Mamas mais volumosas ou ingurgitadas requerem conchas de base flexível e orifício maior.

O benefício do uso das conchas não foi ainda demonstrado cientificamente. Em duas revisões Cochrane recentes, não pode ser demonstrada vantagem do seu uso em relação à prevenção de dor mamária2 e no tratamento do ingurgitamento mamário.16

Mamilos intermediários ou protetores mamilares ou escudos mamilares

Os mamilos intermediários consistem em dispositivos de silicone fino e flexível que são colocados sobre a aréola e o mamilo maternos para proteção. Adicionalmente, favorecem o formato mamilar que melhora com a sucção pelo bebê. É descrito um grau positivo de satisfação por parte de mulheres avaliadas,17 sendo o acessório para amamentação mais aceito e de uso recorrente entre as usuárias.18 Por outro lado, em um grupo de pacientes com dor mamilar persistente à amamentação, o uso de protetores mamilares associadamente ao uso de bombas extratoras pareceu reduzir o volume de leite obtido.19

Comercialmente disponíveis numa variedade de modelos e tamanhos e como para os outros acessórios, não existe base científica disponível indicando benefício inequívoco do uso, embora o perfil de segurança tenha sido aceitável em relação ao risco de diminuição na produção de leite, além de cuidados para evitar acidentes, como a ingesta acidental do dispositivo pelo RN.20

 

DISCUSSÃO

Nossa revisão abordou o tema das evidências disponíveis na literatura para utilização de dispositivos acessórios à extração de leite e acessórios para a amamentação. Encontramos, nos últimos 20 anos, um bom número de estudos originais e excelentes revisões narrativas, integrativas e sistemáticas, que resolvemos incluir nesta revisão.

Embora pobre em evidências científicas que demonstrem benefício inequívoco para o processo de amamentação, o uso de dispositivos acessórios para extração de leite e proteção da mama é comum em diferentes cenários. Existe a indicação científica, contudo, de que a definição do melhor método de extração de leite humano depende de fatores como o tempo pós-parto, o objetivo da extração, a aceitabilidade da mãe, a praticidade, o custo do acessório e efeitos adicionais como o alívio da dor, a proteção mamilar. Intervenções de baixo custo, como iniciar a amamentação logo após o nascimento se possível e manter a extração entre as mamadas, aquecimento das mamas, relaxamento, posicionamento adequado, massagem mamária etc. podem ser tanto ou mais efetivas que o uso de dispositivos ou produtos para a grande maioria dos casos.21

Assumindo a possiblidade de viés de seleção dos artigos, resolvemos realizar uma revisão narrativa com a prática assistencial em saúde, desde que resuma o tema de maneira atualizada, direta, concisa e efetivamente útil.

A revisão dos estudos indica grande heterogeneidade metodológica, pequeno número amostral, grandes desvios padrões e grande diversidade de intervenções.10 Futuros estudos devem atentar para a qualidade metodológica e para a definição clara de desfechos específicos, em populações adequadamente selecionadas e incluindo outras técnicas sem potencial comercial na análise.

Em conclusão, podemos afirmar que o uso de dispositivos acessórios para a amamentação é popular e de boa aceitabilidade, especialmente em populações de países desenvolvidos economicamente, é relativamente seguro, mas não determina benefícios inequívocos em relação a desfechos como duração do tempo de amamentação e volume de leite extraído. Alguns estudos apontam, inclusive, a possibilidade de que a utilização destes dispositivos reduza o tempo de amamentação exclusiva dos lactentes.

Os protetores mamilares são especialmente populares na prevenção e tratamento de dor e lesões teciduais na mama, com maior grau de utilização em relação às conchas mamárias. Quanto à extração mecânica do leite materno, pode ter benefício prático adjuvante em situações específicas, como a necessidade de afastamento da mãe em função de retorno as usas atividades cotidianas. Em situações de internação por prematuridade ou grave acometimento de saúde do RN, as técnicas de extração são importantes aliados para o fornecimento de leite humano continuado. O uso de dispositivos auxiliares para facilitar a extração do leite materno poderá ser de grande utilidade.

 

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