Revista de Pediatria SOPERJ

ISSN 1676-1014 | e-ISSN 2595-1769

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Número atual: 15(1) - Fevereiro 2015

ARTIGOS ORIGINAIS

Conhecimento dos responsáveis sobre a prevenção de acidentes domésticos envolvendo crianças

Statistics on the prevention of accidents involving children

 

Ianni Farias de Abreu Miranda1; Raphaela Soares2; Katerine Torre3; Amanda Costa4; Tereza Fonseca5; Maria Das Graças Fernandes6

1. Acadêmica da Escola de Medicina Souza Marques Diretora de Pesquisa da Liga do Trauma da Escola de Medicina Souza Marques Rua Doutor Dilermando Cruz, 179, casa, Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, RJ, CEP: 0530-060
2. Acadêmica da Escola de Medicina Souza Marques Membro da Liga do Trauma da Escola de Medicina Souza Marques
3. Acadêmica da Escola de Medicina Souza Marques Membro da Liga do Trauma da Escola de Medicina Souza Marques
4. Acadêmica da Escola de Medicina Souza Marques Membro da Liga do Trauma da Escola de Medicina Souza Marques
5. Acadêmica da Escola de Medicina Souza Marques Membro da Liga do Trauma da Escola de Medicina Souza Marques
6. Professora Doutora da Escola de Medicina Souza Marques

 

Endereço para correspondência:

Correspondência:
Ianni Farias de Abreu Miranda
Rua Doutor Dilermando Cruz, 179, casa, Barra da Tijuca
Rio de Janeiro, RJ, CEP: 0530-060

 

Resumo

OBJETIVO: A presente pesquisa teve como objetivo avaliar o nível de conhecimento dos responsáveis envolvendo mães (75%), pais (5%) e avós (20%) que frequentam o serviço de saúde do polo Itanhangá, no Rio de Janeiro, no que se refere à prevenção de acidentes domésticos envolvendo crianças e adolescentes de 2 anos a 13 anos.
MÉTODOS: Aplicou-se um questionário a uma amostra de 20 participantes acima de 22 anos com baixo nível socioeconômico, a fim de avaliar a história prévia de acidentes domésticos, fatores relacionados à prevenção deles e ainda o conhecimento dos participantes de como atuar vigente aos acidentes.
RESULTADOS: Constatou-se que, embora frequentem o serviço de saúde, os responsáveis pouco sabem a respeito de como evitar acidentes. Logo, a prevenção é falha e, com isso, sobrecarregam os serviços de emergência com traumas envolvendo crianças.
CONCLUSÕES: É necessário um enfoque no assunto em questão durante as consultas de puericultura. Sendo assim, o esclarecimento é o primeiro passo para evitar acidentes, visto que melhorar a prevenção é fundamental para transformar o modelo médico atual.

Palavras-chave: acidentes domésticos infantis; perigos domiciliares; prevenção de acidentes domésticos.


Abstract

OBJECTIVE: This study aims to assess the level of knowledge of mothers (75%), fathers (5%) and grandparents (20%) who attend the health service clinic in Itanhangá, City of Rio de Janeiro, regarding the prevention of domestic accidents involving children and adolescents between 2 to 13 years old.
METHODS: A questionnaire was answered by 20 parents over the age of 22 that were from a relatively low socioeconomic level. The purpose of the survey was to evaluate the history of domestic accidents, factors related to prevention, and also to determine the participant's knowledge of past work accidents.
RESULTS: It was found that, through interviews with the health service staff, that the health service officials knew little about how to avoid accidents. The potential for prevention is clearly lacking and its effects thereby remains a burden on the emergency services.
CONCLUSIONS: In conclusion, we feel that it is necessary to focus on this subject matter during the consultations. It is necessary to take this first step to inform patients of the risks in order to avoid accidents and further improve the current medical service.

Keywords: domestic accidents involving children; domestic dangerousness; prevention of domestic accidents.

 

INTRODUÇÃO

Diferente do que possa parecer, a casa representa um potencial local de risco para acidentes, principalmente para crianças e idosos. Segundo Paes (2005): "Por ser o ambiente de maior permanência da criança, o principal local de ocorrência desse evento é o próprio ambiente domiciliar, acentuando-se em crianças mais jovens."1 Além disso, consoante Canabarro et al. (2004), "Os acidentes domésticos representam 35% dos traumatismos envolvendo crianças atendidas nas emergências."2 Assim, evidencia-se a importância da vigilância da familiar nesse ambiente.

Segundo Del Ciampo (2011):

Os acidentes desempenham importante papel no perfil de agravos à saúde da criança em todo o mundo, o que os tornam um grave problema de saúde pública, pois também acarretam sérios prejuízos sociais e econômicos para a família e a comunidade. Sendo assim, há uma necessidade de intervenção dos profissionais de saúde com medidas de prevenção, evitando o grande número de atendimento em trauma infantil, muitos deles resultando em óbito, correspondendo a quase 12% do total de mortes.3

Além disso, os acidentes podem ter consequências na formação psicológica do indivíduo. O estresse, a dor, a hospitalização, as sequelas temporárias ou definitivas e as deformidades certamente podem influenciar o desenvolvimento da criança, assim como atesta Santos et al. (2010):

As crianças são mais vulneráveis às injúrias não intencionais como quedas, ferimentos causados por objetos cortantes, intoxicações, choques e queimaduras. Provavelmente, devido às suas características físicas, psicológicas e comportamentais e por viverem em ambientes projetados para adultos. Observa-se ainda que quanto mais jovem e imatura for a criança, menor sua percepção de risco e sua coordenação motora, sendo maior sua vulnerabilidade e dependência de terceiros, em relação à segurança contra injúrias não intencionais.4

Já conforme Pereira et al. (2009):

Estudos apontam que aproximadamente 25% das crianças sofrem, anualmente, algum tipo acidente que requer atendimento médico ou que limite suas atividades diárias. Portanto, há necessidade de divulgar e refletir sobre as injúrias não intencionais em crianças, lembrando a urgência do papel da família e dos adultos responsáveis na prevenção desses agravos, proporcionando um ambiente saudável, assim como repensar as questões culturais que circundam esse tema.5

Nesse contexto, cabe à família garantir um ambiente saudável; e aos profissionais de saúde informá-la de como fazê-lo. Medidas como retirar objetos pontiagudos e materiais de limpeza do alcance das crianças na casa correspondem a atitudes simples que diminuem o risco de acidentes. O elo familiar é de suma importância para garantir um ambiente saudável. A saúde da criança reflete diretamente na saúde da família, não só por representar um dos membros, mas também, e principalmente, pelo grau de dependência que a criança apresenta em relação aos familiares, sendo considerado um agravo coletivo.

A esse respeito, Canabarro et al. (2004) acrescenta:

relevância do problema, visto como previsível em saúde coletiva revela a necessidade de conhecimento do vivenciar singular de cada família. A saúde da família está vinculada à saúde de seus membros, que, de modo comum, enfrentam crises, aderem ou não a um tratamento, partilham crenças e valores, promovendo ou negligenciando a integridade física e emocional de todos, em especial da criança.2

Como os acidentes domésticos envolvendo crianças constituem um problema de saúde pública, percebe-se a necessidade de maior atenção à saúde da família, realizada pelos profissionais de saúde. Esses devem garantir o empoderamento dos familiares por meio de programas e políticas de saúde que favoreçam a prevenção de acidentes domésticos, a fim de diminuir a incidência das injúrias infantis não intencionais, uma vez que, muitas vezes, a família pouco conhece a respeito das medidas preventivas desse tipo de acidentes, tornando-os mais recorrentes.

Tendo em vista a revisão de literatura supramencionada, este trabalho tem como objetivo analisar o nível de conhecimento dos responsáveis a respeito das medidas de prevenção de acidentes domésticos e a capacidade de identificação dos riscos existentes no domicílio. Um segundo enfoque foi relacionar fatores como, por exemplo, renda e nível de escolaridade aos níveis de conhecimento dos responsáveis sobre a temática abordada. A identificação de quem são os cuidadores das crianças no dia a dia (creche, pai, mãe, avós, vizinhos, entre outros) e relacioná-los aos riscos de acidentes também é objetivo do presente estudo.

Ainda fazendo parte dos objetivos do trabalho, foi importante evidenciar a capacidade dos participantes de saber agir em situações de emergência que envolvem as crianças vítimas de acidentes domésticos, além de analisar, com base nas repostas, os principais riscos encontrados nos domicílios da população estudada. Como objetivo final, o trabalho procura esclarecer os participantes sobre as formas de prevenção de acidentes domésticos, resguardando a saúde das crianças. A intenção de torná-los capazes de identificar os fatores de risco de acidentes no lar e ensiná-los a agir em caso de emergências por acidente doméstico envolvendo crianças contribui para diminuir a incidência das injúrias não intencionais com crianças em ambiente familiar.

 

MÉTODOS

O presente trabalho constitui uma pesquisa de campo na qual se levantaram informações associadas a injúrias internas não intencionais infantis (acidentes domésticos com crianças).

A pesquisa foi realizada com responsáveis por crianças com idade inferior a 13 anos, os quais estavam presentes em um evento comunitário de promoção de saúde, no Polo Itanhangá, situado na Estrada do Itanhangá, 270, Rio de Janeiro. A amostra utilizada no estudo foi escolhida de forma aleatória, sendo formada por 20 responsáveis voluntários distribuídos entre: mães, pais e avós.

Os questionários foram passados em um evento comunitário no dia 17 de março de 2012 pelos membros da Liga de Trauma da Faculdade de Medicina Souza Marques, contando com 34 perguntas ao todo. Dessas, 7 perguntas referem-se à identificação do perfil do participante (renda, profissão, nivel de escolaridade, quantos filhos, idade, idade dos filhos, condições de moradia). As demais correspondem a 27 perguntas cujas respostas, na maioria, se dividem entre "sim" e "não", disponibilizando espaço para maiores detalhes da informação, referentes aos conhecimentos básicos sobre prevenção de acidentes domésticos e condições de risco das moradias (p. ex.: Seu filho já sofreu acidentes em casa? Seu filho já foi atendido em uma emergência devido a um acidente ocorrido em casa? Onde são guardados os produtos de limpeza?).

O questionário foi respondido individualmente pelo voluntário, sendo acompanhado de um membro da Liga, o qual não interferiu nas repostas. O responsável que optou em responder à pesquisa recebeu um termo de consentimento livre e esclarecido, contendo todas as informações necessárias sobre o estudo, bem como sobre o anonimato e o caráter confidencial das informações fornecidas. Os voluntariados assinaram o termo, mantendo uma cópia para si. As dúvidas que surgiram sobre a pesquisa foram esclarecidas com os pesquisadores responsáveis.

Os sujeitos foram questionados sobre os motivos associados aos acidentes domésticos envolvendo crianças, os cuidados tomados, as formas de prevenção e o tipo de socorro usado na ocorrência desses acidentes. Algumas características pessoais como idade e nível de escolaridade, também foram colhidas, permitindo assim, a associação da ocorrência dos acidentes com fatores característicos dos responsáveis.

Os resultados podem apresentar informações com vieses devido ao caráter voluntário dos participantes, que poderiam estar mais inteirados e sensíveis às perguntas dos questionários. Além disso, os resultados basearam-se nas respostas dos participantes, podendo ou não revelar informação de fato verdadeira, em razão de o participante não ser o cuidador responsável pelas crianças ou por desconhecer as informações.

 

RESULTADOS

Das 20 pessoas abordadas, 75% eram mães, 20% eram avós, e 5% eram pais, com idades entre 22 e 30 anos,7 30 e 40 anos,6 e maior que 40 anos.7 Das mães mais jovens (22-30 anos), 20% afirmaram que seus filhos já estiveram envolvidos em acidentes domésticos. Desses responsáveis, apenas 5% tinham nível de aprendizagem técnico, 30% cursaram o ensino médio, 35% cursaram o ensino fundamental, 25% cursaram o ensino básico e 5% não estudaram.

As rendas familiares distribuíam-se da seguinte forma: 5% recebiam abaixo de um salário mínimo; 40% recebiam entre 1 e 2 salários mínimos; 30% recebiam acima de 2 salários mínimos; e 25% recebia acima de 3 salários mínimos. Entretanto, apenas 60% abrangem a população economicamente ativa. Esses resultados são representados no Gráfico 1. Dos 40% que recebiam entre 1 e 2 salários mínimos, 25% afirmaram que a criança já sofreu algum acidente doméstico.

 


Gráfico 1. Renda salarial dos responsáveis (%)

 

As crianças dos responsáveis entrevistados tinham idades de 3 a 13 anos e passam a maior parte do tempo em creches (10%), com os familiares (80%) ou com vizinhos (10%).

Quando indagados sobre acidentes domésticos sofridos pelas crianças, 70% dos responsáveis afirmaram que elas não sofreram acidentes. Entretanto, o Gráfico 2 revela que muitos desconhecem o significado de acidentes domésticos e não enquadram pequenas lesões, como, por exemplo, quedas, ingestão acidental de medicamentos ou produtos de limpeza dentro do conceito de acidentes, usando o termo "acidente" apenas quando há gravidade

 


Gráfico 2. Tipos de acidentes com crianças

 

Sobre os locais de lazer para a criança, 50% brincavam dentro de casa; 20% na rua; 25% na praça ou na quadra; e 5% na laje de casa. Enquanto brincavam, 95% delas eram supervisionadas por adultos; enquanto 5% eram supervisionadas algumas vezes. Na cozinha, em que havia botijão de gás (100%), bem como utensílios propícios para acidentes em caso de escape de gás e explosões, apenas 20% podiam brincar, contrastando com 80% que não podiam,.

Dos entrevistados, 100% tomavam cuidado com os cabos de panela no fogão, para evitar queimaduras. Além disso, 35% relataram armazenar produtos de limpeza longe do alcance de crianças (25% em lugares mais altos, 5 % fora de casa e 5% em cima da geladeira); enquanto os 65% restantes fazem uso de lugares de fácil acesso (25% em armários, 20% embaixo da pia e 20% no chão do banheiro), conforme representado no Gráfico 3.

 


Gráfico 3. Local para armazenar produtos de limpeza

 

Em relação aos remédios, 35% dos participantes da pesquisa informaram que os armazenam em locais de difícil alcance pelas crianças (25% em locais altos e 10% em cima da geladeira); porém, 65% não têm esse mesmo cuidado (40% em armários, 10% dentro de caixas, 10% em gavetas e 5% nas próprias caixas de remédio). De acordo com as respostas dos entrevistados, representou-se a distribuição dos locais mais comuns para guardar remédios no Gráfico 4.

 


Gráfico 4. Local para guardar remédios

 

A inexistência de objetos pérfurocortantes ao alcance das crianças abrangeu 75% dos entrevistados, ao passo que 65% tinham tomadas perto de crianças. Além disso, 15% das crianças soltavam pipa na rua, e 20% sabiam nadar, enquanto 30% faziam uso de boias e 50% não sabiam nadar. Somente 30% dos participantes assumiram saber os perigos domiciliares a que as crianças poderiam se submeter, em comparação a 40% que desconheciam e a 30% que conheciam alguns.

Em caso de acidentes, 10% procuram ajuda de outros parentes; 10% procuram ajuda de vizinhos; 10% medicam a criança em casa; 15% levam a criança acidentada ao posto de saúde; 50% levam a criança acidentada para ser atendida na UPA ou em hospital; e 5% não souberam como proceder em caso de acidentes. Esses dados podem ser verificados no Gráfico 5.

 


Gráfico 5 – Conduta dos responsáveis em caso de acidente

 

Ao serem questionados sobre qual número se deve discar em caso de emergência, 40% acertaram, 20% erraram, e 40% desconheciam esse recurso. Desses 20% relataram ter sidos atendidos no serviço de emergência pelo menos uma vez, como pode ser observado no Gráfico 6.

 


Gráfico 6 Conhecimento do número de atendimento do serviço de emergência

 

DISCUSSÃO

Por ser o ambiente de maior permanência da criança, o principal local de ocorrência de acidentes é o próprio ambiente domiciliar, acentuando-se em crianças mais jovens. Waisman et al. (2002), estudando pacientes na faixa etária de 0 a 14 anos, constataram que "51,9% das injúrias aconteceram no lar e que, quanto mais nova é a criança, maior é o percentual dos eventos que ali ocorrem".6Percebe-se que a idade das mães também influencia a ocorrência de acidentes domésticos. Além disso, dos 40% que recebiam entre 1 e 2 salários mínimos, 25% afirmaram que a criança já sofreu algum acidente doméstico .Pode-se supor uma relação entre a inexperiência de mães de primeiro filho em relação ao conhecimento sobre os riscos de acidentes domésticos, acrescida, muitas vezes, por serem mães que têm atividades extras como, por exemplo, estudo e trabalho , deixando os filhos sob os cuidados de terceiros.

A renda familiar demonstrou ser um fator de influência, uma vez que baixas condições socioeconômicas demonstraram ser um agravante do número de acidentes, por não proporcionar condições adequadas de lazer e de espaço para a criança brincar. Moradias de poucos cômodos, bem como ruas sem saneamento básico e irregulares, são fatores que contribuem para a desestruturação das famílias de baixa renda, assim como planejamento familiar inadequado, com muitos filhos por casa, o que dificulta o tempo dedicado aos cuidados das crianças. As baixas condições socioeconômicas relacionam-se também ao pouco estudo e, por conseguinte, a um conhecimento menor em relação aos riscos de acidentes domésticos.

São diversas situações que podem influenciar a prevalência de acidentes domésticos infantis, incluindo-se aspectos relacionados à educação, ao salário, à moradia, ao acesso a serviços de saúde ou à etnia. Os acidentes também podem ser relacionados a situações circunstanciais, como, por exemplo, desemprego, inexistência de rede de apoio familiar ou grande número de filhos.

No presente trabalho, nota-se que, embora frequentem o serviço de saúde e as crianças passem pela puericultura, os responsáveis pouco sabem a respeito de acidentes domésticos, haja vista que não identificam os riscos que a casa pode oferecer e desconhecem o significado do termo acidente. Muitas vezes, não incluem quedas e lesões de menor gravidade no conceito de acidente, relacionando o termo "acidente" apenas à gravidade das lesões no contexto físico. Entretanto, ainda os que não apresentem riscos à vida, os acidentes sofridos na infância podem influenciar, significativamente, o desenvolvimento não apenas físico como também psicossocial da criança.

Acidentes na infância podem ser fatores incapacitantes. São grandes os atendimentos na emergência devido a traumas sofridos no lar. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), na faixa etária de 5 a 14 anos, as quedas ocuparam, no mundo, em 2000, o 5º lugar como causa de sobrecarga de doenças. No Brasil, segundo dados do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS), no ano de 2002, morreram 443 crianças e adolescentes, na faixa etária de 0 a 19 anos, vítimas de quedas.

As quedas representam a principal causa de internação na população pediátrica, inclusive no Brasil. Em 2004, as quedas representaram o principal motivo de internação hospitalar em todas as faixas etárias de crianças e jovens de até 19 anos, com 73,01% das internações por causas externas. Embora a grande maioria resulte em um traumatismo não fatal, as quedas podem representar risco para sequelas neurológicas e ortopédicas.

A queimadura é um tipo de injúria que ocorre predominantemente em casa, em especial na cozinha, acometendo, principalmente, pacientes de 1 a 4 anos e levando dor e sofrimento à criança, deixa sequelas e compromete seu psiquismo. Para as crianças que sofrem queimaduras graves, a reabilitação é demorada, havendo risco de prejuízo do crescimento ósseo e perdas funcionais. No Brasil, em 2002, segundo dados do DATASUS, morreram 266 crianças e adolescentes, na faixa etária entre 0 e 19 anos, vítimas de exposição à fumaça, ao fogo e às chamas.

No presente trabalho, nota-se que ocorreu um número significativo de acidentes com queimaduras, principalmente devido à presença de crianças na cozinha, por falta de espaço físico para o lazer infantil, o que se agrava pelo fato de todos utilizarem botijão de gás como fonte para o preparo dos alimentos.

O desconhecimento dos responsáveis de como evitar os acidentes é, sem dúvida, o fator mais preocupante entre os correlacionados, porque a grande maioria não sabe como prevenir ou como agir em caso de acidentes. O local inadequado para armazenar produtos de limpeza e medicamentos é responsável pelo número de eventos de intoxicações exógenas.

O estudo de Rangel et al. (2004),8 a respeito de 609 pacientes vítimas de intoxicações, com idade entre 0 e 14 anos, mostrou que 98,7% dos eventos aconteceram em casa; 53% eram crianças na faixa etária entre 0 e 4 anos, vítimas de intoxicações acidentais, das quais os meninos totalizaram 58,2%. Segundo os autores, o grande número de intoxicações entre crianças pequenas deve-se à curiosidade delas em procurar descobrir o ambiente à sua volta e levar substâncias à boca. Com os pacientes de 10 a 14 anos, ocorreram 32,6% das intoxicações, das quais, diferentemente do grupo anterior, 67,3% foram intencionais, tendo havido predominância do gênero feminino (78,3%).

Os afogamentos são importantes causas de mortes infantis, principalmente nas idades menores; entretanto, no presente estudo não houve constatação de afogamentos. Rimsza et al. (2002) constataram que:

a maioria das crianças que se afogam são menores de 5 anos; 61% dessas mortes aconteceram em piscinas particulares. Consideram que o maior risco para afogamento é encontrado em uma piscina no quintal da casa quando um menino pequeno está sem supervisão de um adulto.9

A conduta dos responsáveis em caso de acidentes revela que grande parte, além de não saber como prevenir os acidentes, não sabe como agir na evidência do acidente. Dos entrevistados, 60% não sabem o número do serviço de emergência do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU). Sendo assim, evidencia-se a necessidade do esclarecimento como a melhor forma de atuar para prevenção de traumas infantis domésticos, constantes na rotina emergencista.

Aplicar um modelo médico que não se baseia em medidas curativistas e de reabilitação impõe ao médico e aos demais profissionais de saúde uma atuação maior para evitar o problema. Os acidentes envolvendo crianças são causas de incapacitação, de prejuízo à sociedade e ao serviço de saúde; portanto, exigem uma intervenção ativa dos profissionais de saúde principalmente diante da população mais carente.

 

CONCLUSÕES

Os resultados evidenciam, a partir da análise dos dados coletados nos questionários, que ainda há um alto nível de desconhecimento dos responsáveis em relação à caracterização de um acidente doméstico e de como proceder na ocorrência de um. Com isso, observa-se uma dificuldade na manutenção da casa como um lugar seguro e que abrigue medidas de proteção em relação aos perigos aos quais as crianças são expostas, tornando os acidentes menos recorrentes.

Portanto, urge a necessidade de maior atenção à saúde da família, garantindo o empoderamento dos familiares por meio de programas e de políticas de saúde que abranjam a prevenção de acidentes domésticos, além de um aumento da divulgação e da propaganda do número do serviço de emergência SAMU, para que não haja sobrecarga de serviços de saúde indevidos. Além disso, deve haver um maior enfoque da questão durante as consultas de puericultura, promovendo um maior esclarecimento dos pais e dos familiares.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. PAES CEN, GASPAR VLV. As injúrias não intencionais no ambiente domiciliar: a casa segura. Jornal de Pediatria 2005.

2. CANABARRO ST et al. Traumas infantis ocorridos em domicílios. Revista gaúcha de enfermagem 2004.

3. DEL CIAMPO LA. Características clínicas e epidemiológicas de crianças acidentadas atendidas em um serviço de pronto-atendimento. Pediatria 2011.

4. SANTOS, BZ et al. Injúrias não intencionais na infância: estudo piloto com mães que frequentam a clínica de bebês da Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil. Pesquisa Brasileira em Odontopediatria e Clínica Integrada maio-agosto de 2010, 10(2),.

5. PEREIRA AS et al. Determinação de fatores de risco para a queda infantil a partir do modelo Calgary de avaliação familiar. Revisa Brasileira em Promoção de Saúde abril-junho de 2010; 23(2).

6. WAISMAN INJM, SÁNCHEZ J. Epidemiologia de los accidentes en la infancia en la Región Centro Cuyo. Rev Chil Pediatr 2002.

7. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Morbidade hospitalar do SUS por causas externas por local de residência - Brasil. 2004.

8. Rangel AM, Hernández MF, Herrera ER, Martínez LA. Morbilidad por intoxicaciones agudas en el Hospital Pediátrico de Cienfuegos durante el quinquenio 1996-2000. Rev Cubana Pediatr 2004.

9. Rimsza ME, Schackner RA, Bowen KA, Marshall W. Can child deaths be prevented? The Arizona child fatality review program experience. Pediatrics 2002.