Revista de Pediatria SOPERJ

ISSN 1676-1014 | e-ISSN 2595-1769

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Número atual: 25(1) - Março 2025

Pesquisa Original

Avaliação dos fatores que influenciam no volume de leite materno coletado em um hospital em Porto Alegre-RS

Evaluation of the factors that influence the volume of breast milk collected in a hospital in Porto Alegre-RS

 

Patricia Amaral Vasconcellos1; Mauricio Obal Colvero1; Humberto Holmer Fiori2

 

DOI:10.31365/issn.2595-1769.v25i1p42-52

1. Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, Departamento de Pós-Graduação em Pediatria - Porto Alegre - Rio Grande do Sul - Brasil
2. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Departamento de Pós-Graduação em Pediatria e Saúde Coletiva - Porto Alegre - Rio Grande do Sul - Brasil

 

Endereço para correspondência:

pathyvasconcellos@yahoo.com.br

Instituição: Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, Departamento de Pós-Graduação em Pediatria - Porto Alegre - Rio Grande do Sul - Brasil.

Recebido em: 10/06/2023
Aprovado em: 20/01/2025

 

Resumo

INTRODUÇÃO: O leite materno tem papel fundamental para o crescimento, desenvolvimento e manutenção da saúde da criança. O conhecimento dos fatores que interferem na produção de leite materno é necessário para melhor manejo e orientação das lactantes.
OBJETIVOS: Verificar que variáveis mais interferem na produção de leite materno. Correlacionar os medicamentos utilizados aos volumes de leite retirado.
MÉTODOS: O período de estudo foi de janeiro de 2014 a outubro de 2021. Os dados foram coletados em banco de dados de um banco de leite de um hospital de uma capital brasileira, com informações sobre volumes coletados, pré-natal, medicamentos utilizados e doenças preexistentes.
RESULTADOS: A amostra foi composta por 2.130 mães doadoras de leite materno, com média de idade de 28,9 anos. A idade materna e a presença de comorbidades demonstraram correlação com a redução de volume de leite materno produzido (p<0,001). Mães que realizaram o pré-natal retiraram volumes de leite maiores (p=0,039), bem como mães eutróficas em relação a obesas (p=0,018). O uso de medicamentos como metildopa (p<0,001) e sulfato ferroso (p=0,004) também se relacionou a um menor volume de leite retirado. Por outro lado, o uso da sulpirida promoveu um aumento no volume de leite retirado.
CONCLUSÃO: A presença de comorbidades maternas e o uso de medicações se relacionaram a uma menor retirada de volume de leite materno, ao passo que a realização de pré-natal e uso de sulpirida se relacionaram ao aumento de volume de leite materno retirado.

Palavras-chave: Aleitamento Materno. Extração de Leite. Bancos de Leite Humano. Leite Humano.


Abstract

INTRODUCTION: Breast milk is fundamental to children's growth, development, and overall health maintenance. It is, therefore, necessary to know the factors that interfere with human breast milk production to express better and store it and guide the mothers.
OBJECTIVES: This study intended to verify which variables interfere the most in the production of human breast milk, and to correlate the medication taken by the mothers with the volume of milk that was produced.
METHODOLOGY: This study was conducted between January 2014 and October 2021. The data was extracted from a database containing information regarding the milk volume collected, prenatal exams, medications taken by mothers, and preexisting diseases.
RESULTS: The sample comprises 2.130 mothers who donate breast milk, with an average age of 28,9 years. There was a correlation with the volume of milk collected, advanced maternal age, and comorbidities. Mothers who had their prenatal exams expressed higher volumes of milk, as well as the eutrophic mothers in relation to the obese ones. The use of medication was also linked to a decrease in the volume of milk that was collected. On the other hand, the use of sulpiride promoted increased volume.
CONCLUSION: The presence of maternal comorbidities and the use of medication was linked to a decrease in the volume of breast milk that was collected, whereas prenatal exams and the use of sulpiride were related to an increase in its volume.

Keywords: Breast Feeding. Milk Ejection. Milk Banks. Milk, Human.

 

INTRODUÇÃO

Uma das formas mais adequadas de prevenção de mortes infantis é o aleitamento materno, que promove, ainda, a saúde física, mental e psíquica da criança e da mulher que amamenta. Recomenda-se o aleitamento materno por dois anos ou mais, sendo exclusivo nos primeiros seis meses de vida.1 O leite materno possui o equilíbrio ideal de nutrientes e a biodisponibilidade adequada para o desenvolvimento do bebê, além de seu aspecto emocional e da proteção específica que o leite humano proporciona.2 O papel protetor do aleitamento materno exclusivo na redução da morbimortalidade infantil é unânime.3,4

Diversos fatores influenciam na produção de leite pelas mães, agindo de forma positiva ou negativa. Dentre eles, os principais são fatores socioeconômicos, grau de escolaridade da mãe, idade da mãe, trabalho materno, bem como a intenção da mãe de amamentar.5,6 Dentre as dificuldades mais frequentes encontradas pelas mães está a percepção da baixa produção de leite,7 principalmente entre as mães de prematuros, as quais tendem a produzir um volume de leite insuficiente.8

O estudo teve por objetivo conhecer o perfil das doadoras de leite do banco de leite, analisando os fatores e dificuldades que mais afetam a produção de leite. Ao analisar quais são as variáveis que mais interferem na produção, será possível prevenir a baixa produção de leite pelas mães e contribuir para o aprimoramento de técnicas de coleta, medida necessária para ajudar a reduzir a mortalidade neonatal.

 

METODOLOGIA

Foi desenvolvido um estudo epidemiológico, retrospectivo, de corte transversal com abordagem quantitativa. O período de estudo foi de 1º. de janeiro de 2014 a 31 de outubro de 2021. Os dados foram coletados em um banco de dados no Banco de Leite Humano localizado no Hospital Santa Clara da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre-RS.

Para as associações ao volume de leite produzido, utilizaram-se os quartis para a classificação em quatro grupos: o primeiro foi composto por volumes abaixo do primeiro quartil (<16 ml por retirada) e denota o grupo com mais baixa produção de leite (quartil inferior); a segunda classificação envolveu volumes que ficaram entre o 1º e o 2º quartil (entre 16 ml e 31,9 ml); a terceira classificação, por volumes entre o 2º e o 3º quartil (entre 32 ml e 66 ml). Por fim, o quarto e último grupo incluiu as mães que produziram mais de 66 ml de leite (acima do 3º quartil), representando o grupo com mais alta produção de leite (quartil superior).

Para comparar médias entre os quatro grupos, aplicou-se a Análise de Variância (ANOVA) complementada por Bonferroni. Em caso de assimetria, o teste de KruskalWallis, em conjunto com Dunn, foi utilizado. Para a comparação de proporções entre os quatro grupos, o teste qui-quadrado de Pearson, em conjunto com a análise de comparações múltiplas de Bonferroni, foi aplicado. Os dados coletados foram compilados para o Programa Microsoft Office - Pacote Excel 2010. O nível de significância adotado foi de 5% (p<0,05) e as análises foram realizadas no programa SPSS versão 28.0.

O estudo atendeu às recomendações da Resolução n° 466/2012, que estabelece procedimentos sobre as pesquisas com seres humanos. Foi analisado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do Hospital da Criança Santo Antônio, sob número do parecer 4.495.055. Foi solicitada a dispensa do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, tendo em vista que se trata de pesquisa em banco de dados.9

Foram incluídas no estudo todas as mães doadoras de leite materno que foram até o banco de leite no período de 1º. de janeiro de 2014 a 31 de outubro de 2021. Foram excluídas todas as mães doadoras de leite materno que foram até o banco de leite no período anterior e posterior ao do estudo, além das mães doadoras em domicílio e das doadoras em postos de coleta.

Limitações do estudo

O estudo descreveu o conhecimento do perfil das doadoras de leite humano do banco de leite humano. Consequentemente, ao analisar quais são as variáveis que mais interferem na produção, será possível prevenir a baixa produção de leite pelas mães e contribuir para o aprimoramento de técnicas de coleta de leite. No entanto, possíveis limitações do estudo podem ser o tamanho amostral, a utilização de dados provenientes de banco de dados dos pacientes, a medida utilizada para a coleta de dados e as devidas restrições de tempo em questão.

 

RESULTADOS

A amostra foi composta por 2.130 mães doadoras de leite materno, com média de idade de 28,9 anos (média ± DP de 7,0). A predominância foi de mães que trabalham (69,6%). Das comorbidades apresentadas, as três mais frequentes foram, respectivamente, anemia (25,4%), hipertensão gestacional (15,4%) e diabetes gestacional (14,4%). Quase a totalidade das mães realizou pré-natal (99,2%), com média de aproximadamente 9 consultas (± 3,4). Praticamente metade das mães realizou o pré-natal em rede pública (48,2%), ao passo que a outra metade, em rede privada (49,2%), conforme demonstra a Tabela 1.

 

 

Quanto ao estado nutricional pré-gestacional, 46,1% das mães eram eutróficas, 27,1% estavam com sobrepeso, 23,6% eram obesas e somente 3,2% estavam com baixo peso. A média de ganho de peso durante a gestação foi de 11,3 kg (± 7,0). O tipo de parto mais predominante foi a cesárea (58,8%). Do total da amostra, 36,1% dos bebês nasceram prematuros e 58,7% das mães eram primíparas.

Em relação à amamentação de filhos anteriores, neste estudo, 82,3% das mulheres participantes, amamentaram por 12 meses em mediana. Além disso, 76,4% das mães, amamentaram exclusivamente por seis meses em mediana (P25-P75).

O número de idas ao banco de leite foi de cinco, em mediana, com volume de leite produzido de 31,8 ml (P25-P75), em mediana, para ambas as variáveis de acordo com a Tabela 1.

Em relação aos bebês, 53,6% eram do sexo masculino e 45,9% do sexo feminino (Tabela 2). Do total da amostra, 74,6% dos bebês precisaram ser internados, 31,3% nasceram com baixo peso e apenas 2,4% eram gemelares (média ± DP).

 

 

Do total de mães, 17,3% fizeram uso de medicação durante a gestação. As medicações mais utilizadas foram, respectivamente, metildopa (4,4%), sulfato ferroso (3,7%) e levotiroxina (3,2%) (Tabela 3).

 

 

Tanto para volume médio de leite e quanto para o número de idas ao banco de leite, no ano de 2021, os valores foram significativamente mais baixos do que nos demais anos - principalmente antes de 2019 (Tabela 1). Ainda, quanto ao número de idas ao banco de leite, o ano de 2020 também apresentou valores significativamente mais baixos do que os anos anteriores a 2019 (mediana P25-P75 para ambas as variáveis).

As associações do volume de leite produzido às demais variáveis estão apresentadas na Tabela 4. A média de idade das mães do grupo de quartil inferior (<16 ml) foi significativamente mais alta do que a dos grupos de quartis intermediários (entre 1º e 3º quartis) (p<0,001).

 

 

Em relação às comorbidades de toxoplasmose (p=0,004), diabetes melitos (p=0,013), diabetes gestacional (p<0,001), anemia (p<0,001), hipertensão (p<0,001) e hipertensão gestacional (p<0,001), as mães do quartil inferior de volume de leite produzido (<1º quartil) as apresentaram com ocorrência significativamente maior quando comparadas às do quartil superior (>3 º quartil). A sífilis ocorreu de forma mais prevalente no segundo grupo (entre o 1º e o 2º quartis), em comparação ao grupo de quartil superior (>3º quartil), de forma estatisticamente significativa (p=0006). O hipotireoidismo foi significativamente mais frequente no grupo de quartil inferior (<1º quartil) quando comparado ao terceiro grupo (entre o 2º e 3º quartil) (p=0,010), ou seja, mulheres que se apresentaram com volume de leite no primeiro quartil detinham maiores números de comorbidades.

O número de consultas de pré-natal foi significativamente mais alto no grupo acima do 3º quartil (grupo com maior produção de leite), em comparação ao grupo situado entre o 2º e 3º quartis de produção de leite (p=0,039).

Quanto à situação pré-gestacional, mães com eutrofia foram significativamente mais observadas no grupo de quartil superior (>3º quartil); já aquelas com obesidade, mais frequentemente no grupo de quartil inferior (<1º quartil) (p<0,001). Corroborando esse achado, as mães que mais ganharam peso foram as que tiveram maior produção de leite (p=0,018).

O número de idas ao banco de leite foi significativamente menor nos grupos de quartil inferior (<1º quartil) e, surpreendentemente, no de quartil superior (>3º quartil) (p<0,001).

Internações do recém-nascido e bebês de baixo peso foram mais frequentes no grupo de quartil inferior de produção de leite (<1º quartil) e significativamente menos frequentes no grupo de quartil superior de produção de leite (>3 º quartil) (p<0,001 para ambas as variáveis).

O uso de medicações foi significativamente mais frequente no grupo do quartil inferior (<1º quartil). Em relação às medicações metildopa (p<0,001), levotiroxina (p=0,042), sulfato ferroso (p=0,004), metformina (p=0,004) e insulina (p<0,001), as mães do quartil inferior (<1º quartil) apresentaram uma frequência de uso dessas medicações significativamente maior quando comparadas às mães do quartil superior (>3 º quartil). Quanto ao uso de sulpirida, ocorreu o contrário, ou seja, as mães do quartil superior (>3º quartil) apresentaram significativamente maior frequência de uso dessa medicação em comparação às mães do quartil inferior (<1 º quartil) (p<0,001).

 

DISCUSSÃO

Diversos fatores interferem nos volumes de leite materno retirado, dentre eles a idade materna. No presente estudo, a média de idade das mães do grupo de menor produção de leite foi significativamente mais alta em relação aos grupos de quartis intermediários. A idade média das 70 participantes de um outro estudo foi de 28,5 anos - semelhante ao presente estudo, que foi de 28,9 anos.10 Em um estudo também realizado em um banco de leite, a maioria das doadoras eram adultas jovens, com idade entre 20 e 29 anos, assim como no presente estudo.11

Um estudo transversal com 770 acompanhantes de crianças menores de 12 meses realizou associação significativa entre aleitamento materno exclusivo e idade materna, demonstrando que as mães adolescentes tinham mais chances de não seguirem adotando o aleitamento exclusivo para seus filhos em relação às mães com idade entre 20 e 25 anos e com 35 anos ou mais.12 Por isso, nota-se que a idade materna é um fator importante e que deve ser considerado ao analisar os fatores relacionados à produção de leite, uma vez que mães com idade inferior a 20 anos tendem a introduzir alimentos mais precocemente na vida do bebê.13

No presente estudo, em relação à amamentação de filhos anteriores, 82,3% das mulheres amamentaram por 12 meses. Além disso, a maioria (76,4%) seguiu com aleitamento materno exclusivo por 6 meses. No estudo, que também investigou o perfil das doadoras do Banco de Leite Humano, seus resultados demonstraram que metade das doadoras realizou aleitamento materno exclusivo até os seis meses de vida.11 Porém, em um estudo que correlacionou mães com excesso de peso ao aleitamento materno exclusivo, a média da duração do aleitamento materno exclusivo foi de 3,7 meses.14

Em um estudo observacional com as nutrizes de um Banco de Leite Humano, utilizou-se um questionário que revelou que, das 70 mães doadoras, 66,67% trabalhavam.10 No presente estudo, os resultados foram semelhantes, com predominância de mães que trabalham (69,6%). Isso também se associa à possibilidade de introdução de alimentos complementares, o que contribui para a redução da produção do leite materno.11,15

Em um estudo que analisou a influência do retorno ao trabalho de mães trabalhadoras da enfermagem no período de aleitamento, os resultados demonstraram que as principais influências do retorno ao trabalho na amamentação foram: a falta de apoio dos colegas de trabalho; e a necessidade de local e tempo adequados para a amamentação. Com isso, os volumes de leite sofrem extremas interferências do meio, prejudicando sua produção.16

Em relação ao tipo de parto, neste estudo predominou a cesárea, assim como no estudo de Silva.10 No estudo que comparou a incidência de amamentação conforme o tipo de parto, os resultados demonstraram que a duração da amamentação foi similar entre os nascidos por parto vaginal e cesariana emergencial; os nascidos por cesariana eletiva apresentaram risco três vezes maior de interromper a lactação no primeiro mês de vida.17

Neste estudo, das comorbidades apresentadas, as três mais frequentes foram, respectivamente, anemia (25,4%), hipertensão gestacional (15,4%) e diabetes gestacional (14,4%). Em relação às comorbidades de toxoplasmose, diabetes melitos, diabetes melitos gestacional, anemia, hipertensão e hipertensão gestacional, as mães com menor produção de leite apresentaram ocorrência significativamente maior dessas comorbidades, quando comparadas às mães com maior produção, ou seja, as doenças foram mais frequentes nas mães com baixa produção de leite. A sífilis ocorreu de forma significativamente mais prevalente no segundo intermediário, em comparação ao grupo de maior produção de leite. O hipotireoidismo foi significativamente mais frequente no grupo de quartil inferior em relação ao terceiro grupo (entre o 2º e 3º quartis).

No estudo de Silva, o pré-natal foi realizado predominantemente na rede privada; já no presente estudo, a maioria das mães realizou o pré-natal (99,2%): praticamente metade delas o fez em rede pública (48,2%), ao passo que as demais, em rede privada (49,2%). Corroborando o presente estudo, que apresentou uma média de nove consultas de pré-natal, no estudo de Silva observou-se uma média de dez consultas10 - estando, assim como em outras pesquisas,15,18 acima do preconizado pelo Ministério da Saúde, que é de, no mínimo, seis consultas.19

Neste estudo, o número de consultas de pré-natal foi significativamente mais alto no grupo de maior produção de leite. Em estudo longitudinal, observou-se que a não realização do pré-natal elevou em 173% o risco de diminuição da duração do aleitamento materno.20

Os resultados do presente estudo demonstraram que, em relação aos bebês, 53,6% eram do sexo masculino e 45,9% do sexo feminino. Do total da amostra, 74,6% dos bebês precisaram ser internados, 36,1% dos bebês nasceram prematuros, 31,3% nasceram com baixo peso e apenas 2,4% eram gemelares. As internações dos recém-nascidos e dos bebês de baixo peso foram significativamente mais frequentes no grupo de quartil de menor produção de leite e menos frequentes no grupo de quartil de maior produção. A prematuridade ocorreu com maior frequência no grupo de menor volume. Em outro estudo, as mães de prematuros tendem a produzir um volume de leite insuficiente para atender às necessidades nutricionais do seu filho; dentre as dificuldades mais frequentemente relatadas pelas mães, está a percepção de baixa produção de leite.8

Neste estudo, observou-se que 58,7% das mães eram primíparas, o que corrobora outros estudos. No estudo que avaliou a associação entre as variáveis maternas e o aleitamento materno exclusivo, houve associação significativa entre as variáveis multiparidade e o aleitamento materno exclusivo, demostrando-se como variável protetora para essa prática.21

Os resultados deste estudo demonstraram que o volume de leite produzido foi de 31,8 ml, e que o número de idas ao banco de leite foi de cinco, sendo significativamente menor nos grupos de menor produção de leite. De acordo com os estudos de Hartmann, logo após o nascimento, normalmente um pequeno volume de leite é produzido: 37 a 169 ml de colostro durante as primeiras 48 horas.22 A partir do 5º dia após o parto, uma mulher pode produzir de 500 a 750 ml de leite diariamente e, após o 14º dia, de 700 a 1.000 ml diariamente.23 Mães de gêmeos podem produzir dois litros ou mais de leite por dia, demonstrando que os mecanismos fisiológicos podem adaptar a produção de leite às necessidades nutricionais dos lactentes.24

Neste estudo, tanto para o volume médio de leite como para o número de idas ao banco de leite, no ano de 2021 os valores foram significativamente mais baixos do que nos demais anos, principalmente antes de 2019, provavelmente devido à pandemia pelo coronavírus. Ainda, quanto ao número de idas ao banco de leite, o ano de 2020 também apresentou valores significativamente mais baixos do que nos anos anteriores a 2019. No estudo que correlacionou a auto-ordenha materna à produção de leite, demonstrou-se o entendimento das mães quanto ao fato de a auto-ordenha do leite ser melhor para o recém-nascido prematuro.25

Os resultados demonstraram, no presente estudo, que, quanto ao estado nutricional pré-gestacional, 46,1% das mães eram eutróficas, 27,1% estavam com sobrepeso, 23,6% eram obesas. A média de ganho de peso durante a gestação foi de 11,3 kg. No estudo de Marques, verificou-se o risco para o desenvolvimento de excesso de peso em filhos de mães com sobrepeso e obesidade entre o primeiro e o terceiro anos de vida.14

Neste estudo, os resultados demonstraram que, na fase pré-gestacional, mães com eutrofia foram significativamente mais observadas no grupo de maior produção de leite; já as mães com obesidade, mais frequentemente no grupo de menor produção de leite. As mães que mais ganharam peso foram as que tiveram maior produção de leite. Isso se deve ao fato de as mães obesas receberem a recomendação de não ganhar muito peso durante a gestação, ao passo que as eutróficas são mais livres em relação a esse cuidado.

No presente estudo, do total de mães, 17,3% fizeram uso de medicação durante a gestação. As medicações mais utilizadas foram, respectivamente, metildopa, sulfato ferroso e levotiroxina. O uso de medicações foi significativamente mais frequente no grupo de menor produção de leite. Quanto ao uso de sulpirida, ocorreu o contrário, ou seja, as mães do quartil superior apresentaram frequência de uso significativamente maior em comparação às de menor produção, porém, o uso de sulpirida como galactogogo é contraindicado, devido à possibilidade de desenvolver efeitos adversos maternos, incluindo reações extrapiramidais e sedação.26 Em uma coorte com 838 lactentes com mães em uso de medicamentos, a incidência de reações adversas nos bebês foi de 11,2%. Todas as reações foram classificadas como reações menores, não havendo necessidade de cuidados médicos.27

 

CONCLUSÃO

A presença de comorbidades maternas e uso de medicações se relacionaram a um menor volume de leite materno produzido, ao passo que a realização de pré-natal e o uso de sulpirida se relacionaram ao aumento do volume de leite materno retirado, embora seu uso seja contra-indicado durante a amamentação. As comorbidades, tais como de toxoplasmose, diabetes melitos, diabetes melitos gestacional, anemia, hipertensão e hipertensão gestacional, e o uso de medicamentos como metildopa, levotiroxina, sulfato ferroso, metformina e insulina, além de todos os fatores relacionados, tais como excesso de peso, tipo de parto, idade da mãe, relacionaram-se a um menor volume de leite retirado. A realização de pré-natal e uso de sulpirida se relacionaram ao aumento de volume de leite retirado.

 

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