Revista de Pediatria SOPERJ

ISSN 1676-1014 | e-ISSN 2595-1769

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Número atual: 21(3) - Dezembro 2021

Artigo Original

Análise da prevalência de diarreia e desnutrição em uma unidade de saúde bem estruturada e possíveis fatores associados

Prevalence analysis of diarrhea and malnutrition in a well-structured health unit and possible associated factors

 

Aléxia Alves Cabral1; Amanda Lima da Cunha e Souza1; Márcia Dorcelina Trindade Cardoso2

 

DOI:10.31365/issn.2595-1769.v21i3p107-113

1. Centro Universitário de Volta Redonda - UniFOA, Discente do Curso de Medicina - Volta Redonda - Rio de Janeiro - Brasil
2. Centro Universitário de Volta Redonda - UniFOA, Docente de Pediatria do Curso de Medicina - Volta Redonda - Rio de Janeiro - Brasil

 

Endereço para correspondência:

cabral.alx@gmail.com

Recebido em: 04/07/2020
Aprovado em: 24/04/2021


Instituição: Centro Universitário de Volta Redonda - UniFOA, Volta Redonda - Rio de Janeiro - Brasil

 

Resumo

INTRODUÇÃO: A diarreia e as doenças associadas à desnutrição, segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância, estão entre as principais causas de mortalidade em crianças menores de 5 anos. No Brasil, o aparecimento desses distúrbios tem raízes multifatoriais que poderiam ser evitadas se houvesse cuidados infantis adequados, acesso a serviços de saúde e boas condições de saneamento básico. Por se tratar de doenças que acometem crianças pelo mundo e, portanto, ser um problema social, torna-se fundamental disseminar hábitos alimentares saudáveis e ampliar os conhecimentos a respeito de suas etiologias, complicações, tratamentos e prevenção.
OBJETIVO: Esta pesquisa objetiva identificar os principais aspectos contribuintes para o surgimento de diarreia e desnutrição e investigar suas prevalências.
MÉTODOS: Trata-se de um estudo transversal, realizado na Policlínica Doutor André Sarmento Bianco, na cidade de Volta Redonda-RJ, com as mães de 40 crianças na faixa etária de 0-6 anos. As informações foram obtidas pela aplicação pré-ambulatorial de questionários estruturados com base em critérios socioeconômicos, hábitos alimentares e salutares.
RESULTADOS: Não há indícios alarmantes de diarreia e déficit nutricional nos participantes da pesquisa.
CONCLUSÃO: Isso se deve, em parte, ao fato de a Policlínica em pesquisa já estar estabelecida há muitos anos em um dos principais Centros Universitários da cidade, atuando em prol da disseminação de informação e da prevenção de doenças e complicações, reforçando a importância dos cuidados dos profissionais de saúde na diminuição de agravos e auxílio na manutenção da salubridade.

Palavras-chave: Diarreia infantil. Transtornos da Nutrição Infantil. Saúde da Criança.


Abstract

INTRODUCTION: Diarrhea and diseases associated with malnutrition, according to the United Nations Childrens Fund, are among the leading causes of mortality in children under 5 years. In Brazil, the appearance of diarrhea and malnutrition has multifactorial causes that could be avoided if there were adequate childcare, access to health services and good basic sanitation conditions. Since they are prevalent diseases that affect children around the world and, therefore, are a social problem, the dissemination of healthy eating habits and the expansion of knowledge regarding their etiologies, complications, treatments and prevention are fundamental.
OBJECTIVE: This work aims to identify the main aspects contributing for the emergence of diarrhea and malnutrition and to determine their prevalence.
METHODS: It is a cross-sectional study, carried out in the city of Volta Redonda-RJ, Brazil, with mothers of 40 children aged 0-6 years. The information was obtained through the pre-ambulatory application of structured questionnaires based on socioeconomic criteria, eating and health habits.
RESULTS: There is no alarming evidence of diarrhea and nutritional deficiency in the participants.
CONCLUSION: These results are due, in part, to the fact that the Doctor André Sarmento Bianco Polyclinic has already been established for many years within one of the main University Centers of the city, acting in favor of information dissemination and the prevention of diseases and complications, reinforcing the importance of health professionals's care to reduce such diseases.

Keywords: Diarrhea, Infantile. Child Nutrition Disorders. Child Health.

 

INTRODUÇÃO

Dentre as principais causas mortis que assolam, aproximadamente, 10 milhões de crianças menores de cinco anos anualmente, estão a diarreia e a desnutrição, que poderiam, muitas vezes, ser evitadas se houvesse cuidados infantis adequados, acesso a serviços de saúde e boas condições de saneamento básico.1,2

Em países em desenvolvimento, como o Brasil, as doenças diarreicas agudas estão diretamente relacionadas à ineficiência do saneamento básico e às condições sociodemográficas precárias, nas quais se insere a população infantil. Entretanto, apesar dos vários elementos que condicionam tal patologia, esses podem ser reduzidos por práticas cotidianas promotoras de saúde, como alimentação saudável e higienização das mãos. É necessário, também, que não se perca de vista o conhecimento, os valores e as crenças da população em relação à diarreia.2,3

Sendo a desnutrição uma condição multifatorial, as elevadas necessidades energéticas e proteicas das crianças, a diminuta disponibilidade e distribuição de alimentos devido à iniquidade social, a falta de terra para cultivo, as infecções (virais, bacterianas e parasitárias) e o preparo inadequado de alimentos são elementos que contribuem para seu desenvolvimento.4,5,6 Além disso, outra causa relevante para essa disfunção é o fraco vínculo mãe-filho, relacionado à desintegração familiar.4,5,6

Em referência a essas duas doenças prevalentes na infância e às suas variáveis socioeconômicas, a análise dos dados de uma pesquisa de Vanderlei2 mostrou associação entre hospitalização por diarreia aguda e outras condições de vida das crianças. O estudo apontou forte relação entre baixa idade, desnutrição e evolução desfavorável do episódio diarreico. Sabe-se também que crianças desnutridas têm maior frequência de episódios de infecções respiratórias e diarreia que crianças bem nutridas. Ademais, a incidência de quadros diarreicos é três vezes maior em crianças não amamentadas do que naquelas em aleitamento materno.1 Tal constatação reitera a relevância do aleitamento materno como intervenção efetiva na diminuição da morbidade por doenças infecciosas, tal qual a diarreia aguda.7

Embora haja evidências concretas a respeito da influência direta da nutrição no crescimento infantil, não há a devida preocupação com a alimentação rica em macro e micronutrientes importantes: lactose, proteínas essenciais e não essenciais, ácidos graxos linoleicos, ferro, zinco, iodo e vitaminas A, D e do complexo B, todos componentes do leite materno. A escassez desses nutrientes pode desencadear problemas de sobrepeso e desnutrição na criança e, posteriormente, na vida adulta.8

Essa enfermidade é causa importante de internações hospitalares e óbito, fato que infere um acesso limitado aos serviços de atenção primária. Diante de tal quadro, ressalta-se que a ausência de acompanhamento adequado e da correta avaliação do estado nutricional da criança manterá a desnutrição silenciosa, criando, assim, um grave obstáculo para a manutenção da saúde na infância.9

O cuidado materno é essencial no processo de prevenção e tratamento de crianças desnutridas. Através do auxílio de profissionais da saúde e da rica interação mãe-filho, é possível otimizar os hábitos alimentares infantis, reduzindo os impactos das condições socioeconômicas desfavoráveis à prevenção da desnutrição. Isso indica que a presença da família, junto aos profissionais, é de extrema relevância para que se evite a incidência de doenças nas crianças.10,11,12

Este estudo objetivou caracterizar a prevalência de diarreia e desnutrição em uma população de crianças atendidas na Policlínica do Centro Universitário de Volta Redonda, na cidade de Volta Redonda-RJ, e correlacionar os dados com a literatura e com o grau de conhecimento dos familiares sobre tais doenças, para, assim, traçar estratégias de prevenção e promoção da saúde à população.

 

MÉTODOS

Trata-se de estudo transversal, observacional, realizado em campo, por meio da aplicação de questionário com 23 perguntas objetivas aos responsáveis legais pelas crianças, os quais assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para participarem, no período entre março e maio de 2017. O público-alvo escolhido foi crianças de até seis anos de idade, que sejam consultadas na atenção secundária de saúde, especificamente, na Policlínica Doutor André Sarmento Bianco, no bairro Três Poços, na cidade de Volta Redonda-RJ. Os questionários foram formulados com base em quesitos socioeconômicos, ambientais e alimentares.

Após recolher 40 questionários preenchidos, a análise das informações foi feita por avaliação epidemiológica e estatística, de forma a construir um banco de dados com Microsoft Excel 2010, para avaliação dos resultados, relacionando-os e comparando-os com o levantamento da literatura.

Para a análise da desnutrição, utilizou-se a distribuição do escore-z, com os indicadores peso/estatura, segundo último consenso da Organização Mundial da Saúde, de 2007, que corresponde à seguinte classificação: para valores iguais ou abaixo do escore-z -2, determina-se deficiência nutricional; para valores entre os escores-z -2 e +2, eutrofia; para valores iguais ou acima do escore-z +2, peso elevado para a estatura.

Assim, tais resultados foram usados para confirmar ou refutar a existência endêmica das duas doenças na amostra estudada e elaborar meios de orientação para a população.

A pesquisa obteve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do UniFOA, sob CAAE 60493716.0.0000.5237, na data de 20 de outubro de 2016.

 

RESULTADOS

O estudo identificou um total de 40 crianças de 0-6 anos, das quais 16 (40%) pertenciam ao sexo feminino, enquanto 24 (60%) eram do sexo masculino. O Gráfico 1 ilustra o percentual das faixas etárias da amostra.

 


Gráfico 1. Distribuição de frequência da idade das crianças.

 

Tratando-se da amamentação, das 40 crianças, 19 ainda são amamentadas, indicando uma taxa de 47,5% do total. Quatro crianças na faixa etária entre 0-6 meses ainda são amamentadas, correspondendo a 21% daquelas que ainda recebem aleitamento materno. Isso significa que duas crianças (10,5%) ainda menores de seis meses apresentaram desmame precoce. Seis crianças que possuem entre 7-11 meses são amamentadas (31,5%), abrangendo toda a amostra nessa idade. Oito crianças de 1-3 anos (42%) e uma com idade entre 4-6 anos (5%) ainda são amamentadas.

Ademais, 21 não são amamentadas, correspondendo a 52,5% do total de crianças. Três delas tiveram amamentação suspensa com exatos seis meses (14% do total não amamentado), sendo que essas três crianças têm, hoje, de 4-6 anos. O aleitamento materno foi interrompido com menos de seis meses em oito crianças (38%), sendo que duas nem chegaram a ser amamentadas, segundo relato das mães. Ainda sobre o desmame precoce, houve duas de 0-6 meses (9,5%), três de 1-3 anos (14,2%) e três de 4-6 anos (14,2%). Já em relação ao desmame com mais de seis meses, obteve-se um valor de 10 crianças (47,6%), sendo duas delas de 1-3 anos e oito de 4-6 anos. Vale ressaltar que uma mãe relatou parar a amamentação de seu filho quando este tinha mais de três anos de idade.

A alimentação das crianças participantes apresentou-se bastante variada, com diferentes tipos de alimentos, desde doces, biscoitos recheados e comidas gordurosas, até carnes, ovo, laticínios, frutas, verduras e legumes. Apenas 10 crianças (25%) comem alimentos enlatados/congelados, mostrando que esse tipo não é muito escolhido pelas mães para seus filhos. Das 40, apenas quatro (10%) não comem verduras e legumes e apenas uma (2,5%) não come nenhum tipo de carne, indicando uma boa quantidade de crianças com uma alimentação saudável. E ainda, 10 mães (25%) relataram que seus respectivos filhos não costumam comer alimentos gordurosos.

Sobre a frequência de ingestão de proteína, 26 crianças comem carne diariamente, o que representa 76,4% do total de crianças maiores de seis meses (um bom índice). Os 23,6% restantes comem carne de 1-2 vezes por semana. Quanto ao ovo, 21 crianças comem de 1-2 vezes por semana, representando 61,7% do total de crianças maiores de seis meses. Esses resultados indicam bons índices de dieta proteica.

As condições socioeconômicas avaliadas foram renda familiar e saneamento básico. Das 40 mães que responderam à pesquisa, 22 relataram ter renda familiar de até um salário mínimo, correspondendo a 55% da amostra, enquanto 10 possuem renda maior que um salário mínimo (25%) e oito, maior ou igual a dois salários mínimos (20%). Quanto ao saneamento, todas as participantes alegaram ter água encanada e rede de esgoto em suas moradias.

A ida à Unidade Básica de Saúde teve como predominância uma frequência menor ou igual a uma vez por mês, o que equivale a 92,5% da amostra. Apenas uma criança frequenta a unidade duas ou mais vezes por mês (2,5%). Duas crianças frequentam uma a duas vezes por semana (5%).

Referindo-se à diarreia, de 40 crianças, 10 nunca apresentaram ao menos um episódio diarreico (25%). A frequência de episódios, dentre as que tiveram diarreia, está representada no Gráfico 2.

 


Gráfico 2. Distribuição de frequência de episódios de diarreia.

 

A dor para evacuar, a internação por ocorrência diarreica e a consistência das fezes também foram quesitos analisados. Oito crianças apresentam dor no momento da evacuação (20%) e, das 30 que relataram diarreia, apenas duas precisaram de internação. Quanto à consistência das fezes, 19 crianças eliminam fezes, geralmente, endurecidas (47,5%); duas delas, fezes líquidas (5%) e 19 têm, normalmente, fezes pastosas (47,5%).

O uso de vermífugo, por maiores de um ano (28 crianças), foi feito por 17 delas (60,7%), enquanto 11 ainda não tomaram o medicamento (39,3%). Das que tomaram, seis fizeram uso há mais de um ano (35,3%); oito tomaram no último ano (47%); uma, no último mês (5,9%) e duas, nos últimos seis meses (11,8%).

Em análise da desnutrição, a Tabela 1 exibe a frequência de escores-z associados à relação peso/altura de cada criança, indicando as classificações nutricionais.

 

 

DISCUSSÃO

Este estudo compreendeu a análise de 40 questionários aplicados com os responsáveis de crianças de 0-6 anos e constatou a prevalência total de desnutrição de 0% e de diarreia de 75%. Verificou-se que a idade materna não está diretamente relacionada com o tempo de amamentação da criança, visto que crianças que tiveram sua amamentação interrompida antes dos seis meses de idade possuem mães de todas as faixas etárias estudadas, sem que haja alguma predominante. Ao relacionar dados semelhantes, o estudo realizado com 106 crianças, na unidade de Pediatria do Hospital das Clínicas de Porto Alegre, em Porto Alegre-RS, também não obteve significância estatística.13

Pesquisa realizada com 448 mães de crianças residentes em Fortaleza-CE aponta que a baixa escolaridade materna pode ser contribuinte para o surgimento de quadros diarreicos na região. Tal fato se justifica pela possível dificuldade materna para entender atividades educativas, levando também à ineficácia do cuidar, sobretudo em relação à higiene e à alimentação.3 Em contrapartida, dentre as 30 crianças participantes do presente estudo que tiveram diarreia, 40% delas possuem mães com ensino médio completo, apenas 16,7% com o ensino médio incompleto, 16,7% com ensino fundamental completo, 13,3% com ensino fundamental incompleto e 13,3% com ensino superior completo ou em andamento. O predomínio de mães com ensino médio completo está mais relacionado com o padrão de instrução encontrado nas respostas das mães entrevistadas, as quais equivalem a 40% do total de respostas, do que com a incidência da diarreia na amostra estudada.

A Tabela 2 relaciona o tempo de amamentação com o número de episódios de diarreia. A partir dela, concluiu-se que, assim como com o grau de instrução, não foi possível estabelecer uma sólida relação entre o desmame precoce e os episódios diarreicos nesta pesquisa, uma vez que os índices foram, em geral, bem variados e sem predomínio relevante de dados, sendo necessário maior aprofundamento nesse quesito.

 

 

Sabe-se que o leite materno proporciona à criança proteção, sobretudo nos tratos respiratório e gastrointestinal, por conter, em sua composição, anticorpos IgA secretores e vários outros fatores bioativos que resguardam o bom funcionamento intestinal. Por isso, crianças que recebem aleitamento materno até um ano de idade são internadas com menor frequência por diarreia.14,15 Em relação a esse fato, na análise dos dados obtidos, observou-se que uma criança, das duas que haviam sido internadas por diarreia, teve o aleitamento materno interrompido antes dos seis meses de vida.

Sobre a consistência das fezes, notou-se que, dentre as crianças que já apresentaram quatro ou mais episódios de diarreia, a maioria produz, em geral, fezes pastosas, correspondendo a um valor de aproximadamente 67% dos casos. Isso pode indicar que o maior número de episódios diarreicos implicaria fezes menos endurecidas no dia a dia, mas ainda é necessário realizar mais estudos sobre o assunto, porque, afinal, isso ainda não foi esclarecido pela literatura.

Entende-se que as enteroparasitoses podem afetar o equilíbrio nutricional, interferindo na absorção de nutrientes e induzindo sangramento, diarreia, inapetência, além de causar complicações significativas (obstrução intestinal, prolapso retal, formação de abcessos).16,17

Dito isso, através do atual estudo, observou-se que entre as crianças de 2-6 anos que não tomaram vermífugo, aproximadamente 82% tiveram diarreia. Já entre as que fizeram uso de vermicida, apenas 12% não apresentaram o distúrbio intestinal, enquanto os 88% restantes apresentaram. Entretanto, vale ressaltar que, dentre aquelas que tomaram o vermífugo e tiveram diarreia, 76% tiveram o medicamento administrado há um ano ou mais. Para confirmar a relação entre diarreia e presença de parasitoses, seria necessário realizar um estudo das fezes das crianças entrevistadas, por meio de exame parasitológico.

Entre os casos de diarreia, há um predomínio de renda familiar em torno de um salário-mínimo, correspondendo a aproximadamente 74% da amostra. A baixa renda familiar pode ser um fator contribuinte para o aparecimento de doenças diarreicas e comprometedor para a melhoria das condições de saúde, tendo em vista que seu estudo indica maior prevalência desses quadros em crianças com renda menor ou igual a um salário-mínimo.18 Notou-se que esse valor de renda é o padrão respondido nos questionários em geral, e conclui-se que as condições econômicas da família podem contribuir para a presença ou ausência do quadro.

A qualidade de água é um dos fatores determinantes ou ao menos de risco para a doença diarreica aguda.19 Pode haver redução média de 15-17% no aparecimento desses episódios, em decorrência da melhoria na qualidade da água.20 A partir desses fatos, foi possível constatar que as ótimas condições de saneamento básico da região estudada contribuem para o controle da diarreia, impedindo que haja número preocupante de casos no local.

Os índices de diarreia apresentados correspondem a mais da metade da amostra. Porém, levando em conta a alimentação, o saneamento, a amamentação e as condições socioeconômicas, tais dados não são alarmantes a ponto de haver necessidade de uma política urgente de educação em saúde. Ademais, Queiroz19 afirma que crianças de países em desenvolvimento têm, em média, 50-60 dias de diarreia por ano, fato que não se revela na atual pesquisa.

Tratando-se de desnutrição, a análise dos escores-z para peso/estatura não resultou em nenhum caso desse distúrbio na população estudada, já que foram encontrados apenas valores acima do escore-z-2, apontando, portanto, predomínio de eutrofia. A alimentação variada, com a maioria dos responsáveis alegando que suas crianças apresentam uma dieta proteico-calórica diversificada, pode ser um importante fator contribuinte para a ausência de déficit nutricional em Três Poços. Pelos fatos de 100% dos participantes relatarem possuir saneamento básico e de aproximadamente 80% terem uma renda de até dois salários-mínimos, infere-se que há bons recursos de qualidade de vida e, portanto, bom acesso a uma alimentação adequada, já que, segundo estudos de Motta,21 os desvios nutricionais em determinada população dependem de fatores externos, como a quantidade de recursos disponíveis e a possibilidade de acesso a eles.

Admite-se que a diarreia antecipa e exacerba a desnutrição, e que esta representa uma predisposição para a ocorrência daquela, de modo a aumentar os riscos de suas incidências quando há interação das duas doenças. Esse risco é aumentado porque a desnutrição causa alterações morfológicas e funcionais no trato gastrointestinal, além de seu agravamento provocar uma atrofia da mucosa gástrica, com hipocloridia e hipotonia intestinal, e uma deficiência imunológica, de modo a diminuir a secreção de IgA. Tais condições propiciam o crescimento acelerado de bactérias anaeróbicas no intestino delgado, desequilibrando a flora intestinal e causando déficits absortivos. Quanto à diarreia, a hipersecreção de dejetos diminui o tempo de absorção de nutrientes, havendo elevada eliminação dos mesmos, podendo levar, assim, à desnutrição.22

Dito isso, os baixos índices de diarreia e a ausência de desnutrição encontrados na pesquisa podem designar uma não interação entre os dois distúrbios, de modo a reduzir a ocorrência recorrente na população, pelo fato de um não estar propiciando a existência do outro e vice-versa.

Dentre as limitações do estudo, deve-se considerar a dificuldade de obter uma amostra maior, decorrente de um baixo fluxo de pacientes, no ambulatório elegido, que se enquadrassem na faixa etária abordada, tornando-a pequena para uma análise estatística mais robusta. Além disso, a pesquisa foi unicêntrica, sem avaliação comparativa com outras unidades, o que revela a necessidade de estudos posteriores para dar continuidade e enriquecer os resultados encontrados.

 

CONCLUSÃO

O presente estudo não apontou índices graves de casos diarreicos e de déficit nutricional nos participantes da pesquisa. Isso se deve, em parte, pelo fato de a Policlínica Doutor André Sarmento Bianco estar estabelecida há muitos anos dentro do Centro Universitário da cidade, atuando todo esse tempo em prol da disseminação de informação e da prevenção de doenças e complicações, além de estar localizada em um local provido de boas condições de saneamento básico. Desse modo, nota-se a relevância dos cuidados do médico pediatra com seus pacientes e a importância de associar, na prática clínica, a continuidade da instrução e a facilitação do acesso à saúde, para promover o conhecimento das ideais condutas de prevenção da diarreia e da desnutrição e, assim, evitar suas incidências.

Visto que há a necessidade da integração de cuidados profissionais e familiares, é fundamental que sejam disseminados os hábitos alimentares saudáveis para as crianças e sua família, e que sejam amplificados os conhecimentos sobre as doenças, suas etiologias, complicações e índices de incidência na população, para um melhor manejo pelos profissionais de saúde.

 

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