Revista de Pediatria SOPERJ

ISSN 1676-1014 | e-ISSN 2595-1769

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Número atual: 22(2) - Junho 2022

Artigo Original

Evolução dos casos notificados confirmados positivos pelo RT-PCR SARS-CoV-2 nas diferentes faixas etárias

Evolution of reported cases confirmed positive by RT-PCR SARS-coV2 in different age groups

 

Ana Luiza Freitas Ribeiro; Carolina Rieg Medina; Beatriz Aguiar Delasta; Vera Esteves Vagnozzi Rullo; Maria Célia Cunha Ciaccia

 

DOI:10.31365/issn.2595-1769.v22i2p71-76

Centro Universitário Lusíada, Pediatria, Santos, SP, Brasil

 

Endereço para correspondência:

ciaccia@uol.com.br

Recebido em: 29/08/2021

Aprovado em: 27/03/2022


Instituição: Centro Universitário Lusíada, Pediatria, Santos, SP, Brasil

 

Resumo

O vírus da síndrome respiratória aguda grave do coronavírus 2 (SARS-CoV-2) é causador de uma nova doença, e também de uma pandemia, conhecida como Covid-19, que atingiu milhões de pessoas em todo o mundo.
OBJETIVO: Conhecer a evolução dos casos notificados confirmados pela detecção do ácido ribonucleico (RNA) viral por reação em cadeia da polimerase em tempo real (RT-PCR SARS-CoV-2) nas diferentes faixas etárias.
MÉTODO: Trata-se de um estudo ecológico com coleta de dados a partir da base de dados do Ministério da Saúde de casos notificados confirmados pelo RT-PCR SARS-coV2.
RESULTADOS: As maiores porcentagens de casos positivos foram para a faixa etária maior de 60 anos, sexo masculino e raça branca. Evolução para internação hospitalar, saturação de O2 < 95%, suporte ventilatório e óbito tiveram porcentagens significativamente maiores nas idades mais avançadas. Apesar de as crianças serem menos acometidas, verifica-se que das crianças menores de 29 dias analisadas, 62,7% foram internadas em Unidade de Terapia Intensiva e 77,8% evoluíram para cura. De um total de 2.195 crianças e adolescentes analisados, 12,1% evoluíram para óbito. E dos 100.319 indivíduos maiores de 60 anos analisados, 57,5% evoluíram para óbito. Os pacientes com idades mais avançadas tiveram porcentagens significativamente maiores de alterações na radiografia de tórax. Quanto à tomografia de tórax, esses pacientes tiveram porcentagens de alterações maiores, porém não significativamente.
CONCLUSÃO: As faixas etárias mais avançadas compõem a maioria dos casos de Covid-19 com evolução desfavorável. Apesar de as crianças serem menos acometidas, casos graves também podem ocorrer.

Palavras-chave: Coronavírus. Grupos etários. Evolução clínica. Doença.


Abstract

Coronavirus 2 severe acute respiratory syndrome vírus (SARS-CoV-2) is the cause of a new disease, as well as a pandemic, known as COVID-19, which has affected millions of people.
OBJECTIVE: Assessing the evolution of reported cases confirmed by detection of viral ribonucleic acid (RNA) by real-time polymerase chain reaction (RT-PCR SARS-CoV-2) in different age groups.
METHOD: This is an ecological study with data collected from the Ministry of Health's database of notified cases confirmed by RT-PCR SARS-CoV-2.
RESULTS: The highest percentages of positive cases were for the age group over 60 years, males and whites. The evolution to hospital admission, O2 saturation < 95%, ventilatory support and death had significantly higher percentages in older ages. Although children are less affected, from children under 29 days analyzed, 62.7% were admitted to the Intensive Care Unit and 77.8% progressed to cure. Of a total of 2,195 children and adolescents analyzed, 12.1% died. Out of a total of 100,319 individuals over 60 years of age analyzed, 57.5% died. Older patients had significantly higher percentages of chest X-ray changes. As for the chest tomography, these patients had higher percentages of alterations, but not significantly.
CONCLUSION: The most advanced age groups make up most cases of COVID-19 with unfavorable evolution. Although children are less affected, severe cases can also occur.

Keywords: Coronavirus. Age groups. Clinical evolution. Disease.

 

INTRODUÇÃO

O vírus da síndrome respiratória aguda grave do coronavírus 2 (SARS-CoV-2) é causador de uma nova doença, e também de uma pandemia, conhecida como COVID-19, que atingiu milhões de pessoas em todo o mundo. Os primeiros casos relatados de uma síndrome respiratória aguda surgiram em dezembro de 2019 na cidade de Wuhan, na China,1 e a doença rapidamente se espalhou por todo o mundo.

A partir de então, iniciou-se uma corrida contra o tempo na tentativa de frear o avanço e a disseminação da doença. As medidas de higiene e de isolamento social2 foram fundamentais para conter o avanço do vírus, assim como a criação e aplicação das vacinas, porém evidências mostram que mesmo vacinadas, as pessoas ainda podem se contaminar e transmitir a doença.3

Diante desse cenário, este estudo busca compreender e analisar a evolução dos casos de acordo com as evidências e dados disponíveis. Conhecer o perfil epidemiológico da doença e de seus óbitos é de fundamental importância, tanto para o âmbito clínico, o qual inclui o tratamento farmacológico adotado e suas possíveis medidas como o uso de ventilação mecânica, quanto a adoção de medidas de gestão da saúde, intimamente ligadas à saúde preventiva, e medidas de isolamento, a fim de criar parâmetros que esclareçam o curso da doença e seu desfecho.

O diagnóstico laboratorial específico se baseia na detecção do ácido ribonucleico (RNA) viral por reação em cadeia da polimerase em tempo real (RT-PCR) de amostras de swab nasal e orofaríngeo, o qual é mais efetivo nos primeiros dias após o início dos sintomas. Os testes sorológicos são úteis na detecção da resposta imune.4

Sabe-se que a população mais velha é mais susceptível ao desenvolvimento da doença, geralmente concentrando os casos com pior prognostico e desfecho.5 As crianças apresentam incidência e letalidade inferior à dos adultos e idosos,6 e apesar de apresentarem quadro respiratório e sistêmico leve, também podem transmitir a doença.7

Conhecer a evolução dos casos notificados confirmados pelo RT-PCR SARS-CoV-2 nas diferentes faixas etárias foi o objetivo deste estudo.

 

METODOLOGIA

Trata-se de estudo ecológico com coleta de dados a partir da base de dados do Ministério da Saúde, de casos notificados confirmados pelo RT-PCR SARS-coV2, pelo link https://opendatasus.saude.gov.br/dataset?tags=SRAG, no período de maio a junho de 2021.

Esse link, que dá acesso ao sistema de informação de vigilância epidemiológica das síndromes respiratórias agudas, foi dado pelo Ministério da Saúde em resposta à solicitação realizada através da aba de acesso à informação no site https://www.gov.br, efetuando o pedido pela plataforma https://falabr.cgu.gov.br/ . O critério de inclusão foi a coleta de dados sobre casos notificados confirmados pelo RT-PCR SARS-CoV-2 no período de 1º de janeiro a 12 de abril de 2021, em todas as faixas etárias.

Para as análises dos dados, foi utilizado o software EpiInfo versão 6, de novembro de 1993. E para as análises estatísticas, foi utilizado o teste Qui-quadrado de tendência para as variáveis categóricas ordinais. Estabeleceu-se um valor para rejeitar a hipótese de nulidade de p < 0,05. Foram excluídos os dados dos casos colhidos a partir da base de dados do Ministério da Saúde que estavam como "não responderam" e os ignorados.

Para as análises estatísticas quanto ao Rx de tórax e tomografia, os casos foram dicotomizados em alterados e normais. A proposta de relatório estruturado da Radiological Society of North America classifica os achados pulmonares em quatro padrões:8 1) Padrão típico para pneumonia viral: presença de vidro fosco bilateral periférico ou multifocal de forma arredondada (com ou sem consolidações e pavimentação em mosaico); presença do sinal do halo invertido ou outros sinais de pneumonia em organização. 2) Padrão indeterminado para pneumonia viral: ausência de achados típicos e presença de vidro fosco unilateral, central, tênue, difuso ou de distribuição atípica. 3) Padrão atípico para pneumonia viral: ausência de achados típicos ou indeterminados e presença de consolidação lobar/segmentar/sem vidro fosco, espessamentos septais com derrame pleural, micronódulos centrolobulares ou cavidades. E 4) Exame negativo para pneumonia viral: exame sem alterações pulmonares significativas ou com alterações não infecciosas. Espessamento brônquico, bronquiectasias e nódulos centrolobulares são raros em adultos, sendo mais encontrados na população pediátrica.9

 

RESULTADOS

A tabela 1 mostra os casos notificados positivos pelo RT-PCR SARS-CoV-2 de acordo com idade, sexo e raça no período de 1º de janeiro a 12 de abril de 2021. As maiores porcentagens foram para a faixa etária maior de 60 anos, seguida da faixa etária maior ou igual a 20 anos a menores de 60 anos. As maiores porcentagens foram também para o sexo masculino e raça branca.

 

 

A tabela 2 mostra a evolução dos casos notificados confirmados pelo RT-PCR SARS-CoV-2 para internação hospitalar, internação em UTI, saturação de O2 < 95%, suporte ventilatório e evolução para cura ou óbito nas diferentes faixas etárias.

 

 

A evolução para internação hospitalar, saturação de O2 < 95%, suporte ventilatório e óbito tiveram porcentagens significativamente maiores nas idades mais avançadas. A tabela mostra também que, apesar de as crianças serem menos acometidas, verifica-se que de um total de 137 crianças menores de 29 dias analisadas, 86 (62,7%) foram internadas em UTI. Conforme a evolução, verificou-se que das 90 crianças analisadas menores de 29 dias, 70 (77,8%) evoluíram para cura. De um total de 2.195 crianças e adolescentes analisados, 12,1% evoluíram para óbito. E dos 100.319 indivíduos maiores de 60 anos analisados, 57,5% evoluíram para óbito.

A tabela 3 mostra a evolução dos casos notificados confirmados pelo RT-PCR SARS-CoV-2 quanto a radiografia e tomografia de tórax nas diferentes faixas etárias

 

 

Os pacientes com idades mais avançadas tiveram porcentagens significativamente maiores de alterações na radiografia de tórax. Quanto à tomografia de tórax, esses pacientes tiveram porcentagens de alterações maiores, mas não significativas.

 

DISCUSSÃO

A população de maior faixa etária teve maior número de casos notificados positivos pelo RT-PCR SARS-CoV-2, dados concordantes com o estudo de Jain e Yuan.5 As maiores porcentagens foram para o sexo masculino, assim como encontrado por Santos e Santos,10 que verificaram que os homens foram mais acometidos pela doença, com risco 15,5% maior do que as mulheres. A raça branca é a que mais apresentou casos positivos, seguida pela parda. Já Santos e Santos10 relatam que a cor/raça branca apresenta menor risco em relação às demais raças, no sentido de testar positivo para Sars-Cov-2. Segundo Victora,11 a condição de pobreza pode afetar a prevalência e evolução dos sintomas de doenças contagiosas como a Covid-19, considerando que a população negra, incluindo pretos e pardos, esteja em maior situação de pobreza12. Os dois estudos foram realizados em épocas diferentes, o que pode estar explicando a discordância entre a cor/raça testar positivo para SARS-CoV-2. No estudo de Santos e Santos,10 realizado no início da pandemia, a cor/raça branca teve maior oportunidade de fazer isolamento social, enquanto a raça negra, sem condições de isolamento, teve maior exposição ao vírus. No presente estudo, com o início da vacinação, a cor/raça branca voltando às suas atividades presenciais tornou-se mais exposta ao vírus. A condição de pobreza, agravada pela pandemia, pode ter dificultado o acesso ao sistema de saúde em regiões mais precárias.

Foi observado que a evolução de quase todos os diferentes parâmetros avaliados foi significativamente mais desfavorável nas faixas etárias mais avançadas, como observado também por Rios-González et al.13 O estudo de Garg et al.14 mostrou que as taxas de hospitalização para Covid-19 aumentaram com a idade, e a maioria deles acompanhadas de comorbidades, como doença pulmonar crônica, doença cardiovascular, diabetes mellitus, obesidade e doença renal crônica.15 Tezer e Demirdag16 referem que Covid-19 parece ser uma doença menos grave em crianças do que em adultos, e que aproximadamente 90% dos pacientes pediátricos são diagnosticados como doença assintomática, leve ou moderada. Referem, ainda, que a doença grave é geralmente observada em menores de um ano de idade e pacientes com doenças subjacentes. Segundo Cascella et al.,17 de acordo com os dados de vigilância da Turquia, 50,4% dos casos pediátricos tinha uma doença leve, e 0,8% tinha uma doença grave. A taxa de internação em terapia intensiva foi de 4,27 %, e 80% deles tinham menos de um ano de idade.

A faixa etária pediátrica apresenta incidência inferior em relação às faixas etárias mais avançadas, talvez pelo fato de serem mais protegidas, ficando em casa. Este estudo verificou que, apesar de as crianças serem menos acometidas, de um total de 137 menores de 29 dias de idade analisados, 86 (62,7%) foram internados em UTI. Conforme a evolução, verificou-se que de 90 crianças analisadas menores de 29 dias, 70 (77,8%) evoluíram para cura. Wei et al.18 referem que, embora a maioria se recupere dentro de uma a duas semanas de início da doença, casos graves também podem ser vistos, sobretudo os que estão associados a doenças subjacentes. Dong et al.19 também referem que crianças com menos de um ano de idade com doenças subjacentes estão em maior risco de doença grave. Entre 345 crianças dos Estados Unidos com Covid-19, 23% tinham uma doença subjacente.19

Em relação à evolução para óbitos, a faixa etária dos mais velhos foi a mais afetada, sendo que a maior parte ocorreu na faixa etária maior de 60 anos, como foi observado também por Li et al.20 Neste estudo, no período analisado, pode-se observar que as crianças e adolescentes também apresentaram uma porcentagem de óbito considerável, porém não foi analisado se possuíam doenças subjacentes. No estudo Gomes et al.,21 foi observado que ser adolescente, apresentar caso grave de Covid-19 e imunopatia como comorbidade foram importantes fatores associados ao óbito. Já Hillesheim et al.,22 analisando 6.989 hospitalizações por outra ótica, observaram que 661 (9,5%) evoluíram a óbito e que a maior letalidade foi entre menores de um ano de idade (14,2%), crianças e adolescentes do sexo feminino (9,7%), indígenas (23,0%) e residentes em zonas rurais (18,1%), como também nas regiões Nordeste (15,4%) e Norte (9,7%) do país, concluindo que há diferenças na letalidade hospitalar, conforme as características sociodemográficas e marcantes desigualdades regionais.

A maioria das radiografias de tórax alteradas foi para as faixas etárias mais avançadas, como observado também por Salehi et al.23, os quais verificaram que entre aqueles que apresentaram consolidações na radiografia, os mais velhos foram os mais acometidos. Segundo Kim et al.24 e Pan et al.25, as radiografias de tórax são de pouco valor diagnóstico nos estágios iniciais, enquanto os achados da tomografia computadorizada podem estar presentes mesmo antes do início dos sintomas.

Quanto à tomografia computadorizada de tórax, verificou-se que esta teve diversificação quanto aos aspectos da imagem. Essa diversidade foi observada também por Gu et al.,26 que encontraram a opacidade em vidro fosco, característica mais comum entre os achados.

A principal limitação deste estudo deve é o não correto registro e notificação dos casos pelos profissionais de saúde. E sua principal colaboração é trazer o conhecimento da prevalência e evolução dos casos de Covid-19 nas várias faixas etárias, sugerindo a necessidade de novos estudos mais abrangentes, com maior tempo de duração, para que se possa obter um diagnóstico com mais precisão que permita um tratamento mais adequado dessa doença.

As esferas governamentais devem continuar e intensificar as informações e medidas de controle da Covid-19, dando à população os instrumentos necessários para que se responsabilizem, conjuntamente, pela fiscalização de instrumentos e práticas que possam veicular a infecção, enfim, intensificando as atuações de todas as esferas da vida pública, aperfeiçoando as políticas voltadas ao enfrentamento desse importante problema de saúde pública.

 

CONCLUSÃO

As faixas etárias mais avançadas compõem a maioria dos casos de Covid-19 com evolução desfavorável. Apesar de as crianças serem menos acometidas, casos graves também podem ocorrer.

 

REFERENCIAS

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