Revista de Pediatria SOPERJ

ISSN 1676-1014 | e-ISSN 2595-1769

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Número atual: 21(3) - Dezembro 2021

Artigo Original

Comunicação de notícias difíceis em uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal: atendemos às expectativas dos pais?

Communicating difficult news in a Neonatal Intensive Care Unit: do we meet parents' expectations?

 

Higor Kenedy Ramos1; Síura Aparecida Borges Silva1,2; Maria Luíza Custódio Soares1; Bianca Lisa de Faria1 ; Letícia Monteiro Silva1; Vitor Augusto Ferreira Herculano1; Fernanda Vasconcelos Rezende1; Francisco José Machado Viana2

 

DOI:10.31365/issn.2595-1769.v21i3p92-97

1. Universidade de Itaúna, Curso de Medicina - Itaúna - Minas Gerais - Brasil
2. Maternidade Odete Valadares, Unidade de Terapia Intensiva Neonatal - Belo Horizonte - Minas Gerais - Brasil

 

Endereço para correspondência:

higorkenedy@gmail.com

Recebido em: 21/09/2020
Aprovado em: 27/11/2020


Instituição: Universidade de Itaúna, Curso de Medicina - Itaúna - Minas Gerais - Brasil


 

Resumo

INTRODUÇÃO: A comunicação de uma má notícia em uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal merece atenção especial, pois compreende um cenário clínico complexo, onde as informações e previsões sobre os quadros clínicos variam muito rapidamente, em função da instabilidade do recém-nascido.
OBJETIVOS: Avaliar se as estratégias de comunicação de notícias difíceis atendem às expectativas dos pais e propor melhorias.
MÉTODOS: Pesquisa observacional descritiva do tipo transversal, cuja coleta de dados ocorreu durante cinco meses. Foi elaborado um questionário com questões abertas e fechadas. Foram incluídos pais de recém-nascidos internados durante o período proposto para coleta de dados e cujo tempo de internação foi maior/igual a sete dias.
RESULTADOS: Foram aplicados 62 questionários. A prematuridade foi responsável por 71% das internações. O índice de satisfação geral foi acima de 90% em mais de 55% dos questionários e menor/igual a 70% em 10,8% dos questionários. Nas questões abertas, a resposta sobre a notícia mais difícil esteve relacionada ao diagnóstico da criança. Sobre o que mais incomodou os pais durante as notícias, a resposta de maior frequência foi "nada". A forma como a notícia foi dada foi o principal ponto positivo levantado. A maioria das respostas sobre o que poderia ter sido diferente foi "nada". Sobre sugestões para a melhoria das notícias, as principais respostas foram "nada" e "o local e o tempo disponível para notícias".
CONCLUSÕES: A maioria dos entrevistados relatou "satisfação" em relação à comunicação de notícias difíceis na unidade.

Palavras-chave: Relações médico-paciente. Comunicação em saúde. Terapia intensiva neonatal. Neonatologia.


Abstract

INTRODUCTION: Communicating difficult news in a Neonatal Intensive Care Unit deserves special attention, because it comprises a complex clinical scenario, where the information and predictions about the clinical tables vary very quickly, due to the instability of the newborn.
OBJECTIVES: To assess whether the strategies for communicating difficult news meet the expectations of parents and to propose improvements.
METHODS: Descriptive observational cross-sectional research, whose data collection took place over five months. We prepared a questionnaire with open and closed questions. We included parents of newborns hospitalized during the proposed period for data collection and whose length of stay was longer/equal to seven days.
RESULTS: Sixty-two questionnaires were applied. Prematurity was responsible for 71% of the hospital admissions. The overall satisfaction index was over 90% in more than 55% of the questionnaires and less than/equal to 70% in 10,8% of the questionnaires. In open questions, the response to the most difficult news was related to the diagnosis of the child. Regarding the most disturbing factor for parents during the news, the most frequent response was "nothing". The way the news was given was the main positive point raised. Most responses about what could have been different were "nothing". As for the suggestions for improving the news, the main responses were "nothing" and "the place and the time available for news".
CONCLUSIONS: Most interviewees reported "satisfaction" regarding the communication of difficult news at the unit.

Keywords: Physician-patient relations. Health communication. Intensive care, neonatal. Neonatology.

 

INTRODUÇÃO

Em 1992, o médico oncologista Robert Buckman definiu má notícia como toda informação que envolve uma mudança drástica e negativa na vida da pessoa e na perspectiva do futuro. É todo tipo de anúncio que produz sensações desagradáveis no emissor ou no receptor, e geralmente, está associado ao diagnóstico e ao prognóstico de uma enfermidade.1

O processo de transmissão de notícias difíceis deve ter como meta o alcance de quatro objetivos essenciais. O primeiro é recolher informação do paciente. Isto permite ao médico determinar o conhecimento do paciente e suas expectativas, preparando-o para ouvir a má notícia. O segundo é prover informação inteligível, de acordo com as necessidades e desejos do paciente. Já o terceiro objetivo é apoiar o paciente utilizando habilidades para reduzir o impacto emocional e a sensação de isolamento experimentados pelo receptor da notícia difícil. E, por fim, o quarto objetivo é desenvolver uma estratégia sob a forma de um plano de tratamento com a contribuição e colaboração do paciente.2

Pode-se alcançar esses objetivos por meio do protocolo SPIKES, uma metodologia de comunicação de más notícias elaborada em 1992 pelo oncologista inglês Robert Buckman. Cada uma das seis etapas proposta pelo SPIKES é associada a habilidades específicas. O primeiro passo (Setting up) se refere à preparação do médico e do espaço físico para o evento. O segundo (Perception) verifica até que ponto o paciente tem consciência de seu estado. O terceiro (Invitation) procura entender quanto o paciente deseja saber sobre sua doença. O quarto (Knowledge) será a transmissão da informação propriamente dita. Neste ponto, são ressaltadas algumas recomendações, como: utilizar frases introdutórias que indiquem ao paciente que más notícias virão; não fazê-lo de forma brusca ou usar palavras técnicas em excesso; checar a compreensão do paciente. O quinto passo (Emotions) é reservado para responder empaticamente à reação demonstrada pelo paciente. O sexto (Strategy and Summary) diminui a ansiedade do paciente ao lhe revelar o plano terapêutico e o que pode vir a acontecer.2 Nem todo episódio de transmissão de notícias difíceis irá requerer todas as etapas do SPIKES, mas quando elas são requeridas deverão seguir-se umas às outras, em sequência.

A comunicação de uma má notícia em uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) merece atenção especial. O primeiro contato entre a equipe da UTIN e os pais e familiares do recém-nascido (RN) já consiste em uma notícia difícil, visto que essa criança se encontra fora do contexto habitual e feliz de um parto sem intercorrências. Ainda que a patologia do RN já tenha sido diagnosticada e seja esperada no período pré-natal, é inegável a frustração dos pais em não poder levá-lo para a casa ou para o quarto, após o nascimento.

É fundamental que os pais sejam capazes de compreender a imprevisibilidade do quadro e as informações que lhes são fornecidas de maneira menos traumática possível. A equipe multiprofissional de uma UTIN deve estar preparada para comunicar aos pais uma notícia difícil e assumir uma postura empática e humana. A comunicação entre os pais e a equipe deve ser livre de barreiras físicas, semânticas e, principalmente, pessoais, ou que pelo menos estas sejam minimizadas.

Este estudo propôs avaliar se as estratégias de comunicação de notícias difíceis na UTIN da Maternidade Odete Valadares (MOV), localizada em Belo Horizonte e referência estadual em alto risco no estado de Minas Gerais, atendem a esses princípios e, portanto, às expectativas dos pais.

 

MÉTODOS

Foi realizada uma pesquisa observacional descritiva, tipo transversal, cuja coleta de dados ocorreu durante os meses de agosto a dezembro de 2017, pretendendo avaliar se a equipe médica atendia às expectativas dos pais em relação às notícias dadas na UTIN, por meio da aplicação de um questionário. Considerou-se que a maioria das notícias dadas aos pais em uma UTIN são notícias difíceis, visto que a admissão de um RN em um ambiente de tratamento intensivo foge ao contexto habitual e decorre geralmente de um acontecimento grave e inesperado durante o período neonatal. Além disso, a instabilidade desses pacientes, por sua imaturidade e fragilidade, gera uma expectativa negativa a cada visita dos pais à UTIN, que sempre se sentem apreensivos em relação às notícias, consideradas por eles como difíceis.

As notícias aos pais são diária e rotineiramente dadas, beira leito, sem seguir uma sequência previamente determinada, pelos médicos coordenadores da UTIN. Os plantonistas, excepcionalmente, em horários diversos, fornecem notícias, diante de novas intercorrências, piora clínica, necessidade de procedimentos não previstos ou admissões. A equipe de enfermagem e de fisioterapia também fornece notícias dentro da sua área de atuação. A unidade conta com o acompanhamento psicológico aos pais, porém nem sempre durante as notícias médicas. Os pais ainda têm acesso a uma reunião semanal com a equipe multidisciplinar, onde se discutem dúvidas e trocam-se experiências, sendo também uma oportunidade de receberem notícias.

Durante a revisão de literatura, constatou-se que não havia um questionário único que contemplasse os objetivos propostos. Para tanto, optou-se por criar um questionário com base em três questionários validados, mesclando questões que contemplavam tais objetivos.

A realização dessa tarefa deu-se em três etapas: realizou-se uma revisão de literatura nas bases de dados PubMed e Scielo utilizando os descritores "neonatal intensive care"; "neonatology"; "physician-patient relations"; "health communication", com o objetivo de identificar os elementos-chave para a comunicação de notícias difíceis em saúde e encontrar questionários validados, utilizados para a avaliação proposta nos objetivos. Após uma análise crítica dos estudos encontrados e, levando em consideração a adequação à realidade do serviço e propósitos da avaliação, simplicidade e rigor de suas validações, três instrumentos foram selecionados para essa finalidade: o NIPS, 'Neonatal Index of Parent Satisfaction' (DOI: http://dx.doi.org/10.13072/midss.373), um questionário constituído de 27 itens que avaliam a satisfação dos pais a respeito da assistência prestada nas UTIN;3 o NIPS Adaptado (http://hdl.handle.net/11449/96123), composto por 24 itens e que consiste na tradução para a língua portuguesa e adaptação do NIPS, realizado pela mestranda Adriana Saito;4 e o BAS, Breaking Bad News Assessment Schedule (DOI: 10.1038/sj.bjc.6690423), um método de avaliação desenvolvido em Oxford (Inglaterra) para avaliar quão bem um médico comunica más notícias aos seus pacientes, composto por 23 itens divididos em cinco áreas temáticas.5

As questões do questionário utilizado no presente trabalho são o resultado de adaptações realizadas a partir dos questionários supracitados, pelos pesquisadores do trabalho e neonatologistas do serviço que, com base em sua experiência, deram sugestões. Tais adaptações consistiram em alterações na linguagem utilizada para que as informações ficassem mais claras para os entrevistados e eliminação de itens que não se aplicavam à neonatologia. As duas sessões iniciais do questionário objetivam caracterizar a população de estudo e dizem respeito a dados gerais dos pais e da gestação (idade, procedência, estado civil, escolaridade, pré-natal, parto, periodicidade de visitas ao RN). As sessões subsequentes (tabela 1) contêm 16 perguntas de múltipla escolha que objetivam captar a impressão e satisfação dos pais a respeito das habilidades da equipe médica da unidade em transmitir as notícias. Além disso, visam elucidar a percepção dos pais a respeito do local e tempo para as notícias. Elas possuem como opção de respostas uma escala com quatro níveis de avaliação: "bom (8 ou 9 ou 10)", "razoável (5, 6 ou 7)" e "ruim (menor que 5)", além do "não sei".6 A parte final do questionário (tabela 2) consiste de seis perguntas abertas, cujas respostas foram gravadas visando captar, de forma mais ampla e livre, a percepção dos familiares, seu nível de satisfação e suas sugestões de melhorias.

Antes do início da pesquisa, foi proposta uma avaliação preliminar desse questionário, para verificar a compreensão do mesmo. Primeiramente, ele foi avaliado por dez membros da equipe multidisciplinar da MOV, por meio de uma ficha de avaliação com questões que visaram verificar a clareza do propósito, linguagem e dificuldades que pudessem ser encontradas pelos pais. Posteriormente, foram realizadas as adequações pertinentes sugeridas pela equipe, e o questionário foi aplicado a dez familiares de RN ainda internados na UTIN da MOV, selecionados não aleatoriamente, para que discorressem sobre potenciais dúvidas no preenchimento e dessem sugestões. Após aplicação do pré-teste e afirmação da clareza das perguntas, o questionário foi definido e aplicado aos pais que preencheram os critérios de inclusão na pesquisa.

Após a análise do resultado das 16 perguntas fechadas, foi calculado um escore de satisfação (tabela 3) para medir o índice geral de satisfação dos entrevistados. Para o cálculo desse índice de satisfação, foram considerados dois pontos para a resposta "bom", um ponto para a resposta "ruim" e 0 para a resposta "razoável". As questões respondidas com "não sei" foram excluídas do cálculo, uma vez que elas não indicam satisfação nem insatisfação. Considerando esses valores atribuídos às opções de respostas, as pontuações conferidas pelo participante às perguntas de número 1 a 16 foram somadas. Tal resultado foi dividido pela pontuação correspondente à satisfação máxima (2x16) e o valor encontrado foi multiplicado por 100, o que gerou um escore entre 0 e 100.

Para inclusão na pesquisa, foram considerados pais de RN internados na UTIN por um tempo mínimo de sete dias e que concordaram e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. A aplicação do questionário e a entrevista foram realizadas no momento da alta da unidade.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da FHEMIG sob o número do CAAE 68223917.8.0000.5119 e número do Parecer 2.059.277.

 

RESULTADOS

Foram aplicados 62 questionários aos pais com critérios de inclusão no período proposto para o estudo. A faixa etária das mães entrevistadas variou de 15 a 44 anos, com uma média de 27,2 anos; e dos pais, de 16 a 51 anos, com média de 30,2 anos. A maioria dos questionários e entrevistas foi respondida pelas mães, sendo apenas 3,5% pelos pais. Mais de 96% dos casais afirmaram estar em união estável no momento do nascimento dos filhos.

A escolaridade prevalente entre mães e pais foi o ensino médio - 66% e 69%, respectivamente. Um total de 26% dos entrevistados tinham apenas ensino fundamental. Já o ensino superior, mesmo que incompleto, ficou entre 7% das mães e 5% dos pais.

O tipo de parto que prevaleceu na amostra foi o cesáreo, representando 69,4% contra 30,6% de partos vaginais. Somaram 97% as mães que realizaram pré-natal, com uma média de seis consultas. Do total, 53% afirmaram que a gravidez foi planejada. A média do número de visitas aos filhos na UTIN ficou entre cinco a sete vezes por semana, o que representou 87% das respostas. E o tempo de internação variou de oito a 150 dias, com uma média de 37,26 dias.

Quando questionados se em algum momento da gestação eles foram informados que o bebê poderia ter algum tipo de problema, apenas 19% dos entrevistados responderam que sim. A prematuridade foi o principal diagnóstico dos RN admitidos, correspondendo a 71%, sendo que 72,5% foram prematuros com IG menor que 32 semanas.

O índice geral de satisfação ficou acima de 90% em 55,4% dos entrevistados, entre 81 e 90% em 20,9 % dos entrevistados, entre 71 e 80 % em 12,9 % dos entrevistados e abaixo de 70% em 10,8% dos entrevistados (tabela 3).

As respostas ao questionário aberto estão descritas na tabela 4. Elas foram agrupadas de acordo com o seu significado principal.

 

DISCUSSÃO

Quando se trata de notícias sobre os RN, a situação de não ter a criança junto com a mãe no quarto, logo após o parto, associa-se ao fato de ele precisar de uma atenção especializada, em função de múltiplas causas, sendo a prematuridade um dos principais diagnósticos encontrados. Essa situação foi apresentada como mais impactante para as mães, que embora pudessem estar cientes dessa possibilidade desde a gestação, possivelmente aguardavam que "algo" pudesse acontecer para evitar tal situação. Lidar com tais frustrações dificulta a aceitação e a compreensão das notícias dadas em uma UTIN.

Uma vez sobrevivendo à prematuridade, situação cada vez mais comum nas UTIN, dadas as crescentes taxas de sobrevida de RN prematuros, tais pacientes e seus respectivos pais terão de lidar com uma série de complicações da própria prematuridade que impõem instabilidade clínica e oscilação diária das notícias recebidas. Apesar disso, o índice geral de satisfação dos pais encontrado nesta pesquisa foi bom. Pode- se explicar tal fato pela compreensão, por parte dos pais, de que seus próprios sentimentos de ansiedade e o contexto emocional de cada um interferem no recebimento das notícias. Além disso, a forma franca como as notícias foram dadas, bem como a atenção e o apoio da equipe percebidos foram aventados como pontos positivos e podem ter minimizado o impacto negativo das notícias recebidas.7 Percebeu-se ainda que, quanto maior o tempo de internação do RN, dado um maior número de intercorrências e também um maior desgaste emocional e até mesmo físico dos pais, menor o escore de satisfação.

Outros estudos mostram que a disponibilidade do profissional de saúde para dar a notícia sem pressa, usando uma linguagem clara, sem termos técnicos, é vista de forma positiva pelas famílias, mesmo se tratando de uma situação grave.8 A experiência profissional também é vista pelos familiares como fator positivo no momento das notícias, o que reforça a necessidade de uma capacitação de toda equipe para que informações ambivalentes não criem sentimentos de insegurança nas famílias.

A criação de um espaço específico para a comunicação das notícias e um maior tempo disponível para o contato com os médicos foram as principais sugestões dos pais incluídos nesta pesquisa. Quando trabalhamos na saúde, em especial em setores de alto risco ou de terapia intensiva, a possibilidade de dar uma notícia difícil é um fato que pode ocorrer diariamente. Ter um espaço adequado, confortável e reservado é necessário para oferecermos um ambiente acolhedor. Entretanto, sabe-se que dar a notícia próximo ao leito onde está o RN - postura adotada em nosso serviço - também oferece à família uma compreensão maior do que a equipe informa. Acompanhar de perto a evolução da criança na UTIN, embora possa ser desconfortável, já que não permite privacidade e conforto, pode facilitar o entendimento do que se passa com tais pacientes e dos procedimentos e equipamentos dos quais ele precisa para o seu cuidado.

Como nos aponta Pinheiro,8 não há receita pronta e infalível para essa tarefa. Bom senso, uma boa avaliação sobre a condição de cada família para receber as informações necessárias e o reconhecimento de quem deveria ser o principal interlocutor nessa tarefa constituem o desafio para a equipe. Assim, é importante ter o espaço adequado para notícias. Entretanto, cabe à equipe verificar, para cada momento, o melhor lugar para a comunicação com os familiares.

O questionário utilizado no presente estudo, como já esclarecido, foi uma adaptação de outros questionários e merece ser mais bem avaliado em outros serviços ou até mesmo em novos trabalhos. Para nosso estudo, depois das estratégias de verificação descritas na metodologia, mostrou-se bastante eficiente. Instrumentos dessa natureza devem ser reavaliados periodicamente para que sua validade possa ser sistematicamente verificada.

Foram excluídos desta pesquisa os pais que, por alguma eventualidade, tiveram que lidar com a morte de seus bebês. A mortalidade geral da nossa UTIN varia de 9 a 10%; por isso, no período estudado, teríamos um número pequeno de óbitos. Além disso, seria inadequado submeter tais familiares a um questionário de satisfação frente ao sofrimento que viviam no momento. Acredita-se, também, que a capacidade de avaliação desses pais poderia estar comprometida pela própria vivência de uma perda tão próxima. Assim, acreditamos que esses pais devem compor uma nova população a ser pesquisada, em outra oportunidade, passado o momento do luto.

A Política Nacional de Humanização9 em curso no Sistema Único de Saúde (SUS) desde 2004 tem provocado reflexões e ações que buscam aproximar população usuária do sistema, trabalhadores e gestores da saúde. Essa busca por maior troca entre esses três pilares fundamentais do sistema inclui oferecer à população, além da recuperação da saúde, uma assistência mais individualizada, mais próxima e humanizada. A preocupação com a comunicação de notícias difíceis em várias áreas da medicina faz parte desse projeto. Portanto, entender a realidade local e buscar estratégias que satisfaçam os familiares no recebimento de notícias difíceis nos parecem ser medidas importantes de humanização da assistência prestada.

 

CONCLUSÕES

Ao se preocupar com o treinamento e preparo da equipe assistencial na comunicação de notícias difíceis, os serviços de saúde buscam, além de atender as necessidades dos pais cujos bebês estão internados, preparar melhor toda a equipe para lidar com suas próprias dificuldades e frustações.

Capacitar a equipe é o caminho mais importante a ser trilhado. Não se aprende comunicação de notícias difíceis na universidade nem em cursos de formação de trabalhadores da saúde. Grupos de discussão sistemáticos entre os membros da equipe já se mostraram eficientes em trabalhos realizados em outros serviços, como o Instituto Nacional de Câncer (INCA). Lidar com o sofrimento do outro é tarefa que exige conhecer profundamente nossas limitações, aflições e sentimentos. Precisamos ser capazes de expressar nossos sentimentos, inclusive de tristeza e indignação, mas também ser capazes de compreender que é aquela família que está vivendo os altos e baixos do processo de internação de um RN em uma UTIN e que precisa de nossa atenção e cuidado.

Muitas vezes, a ansiedade dos profissionais de saúde interfere diretamente na capacidade de serem claros na emissão da notícia e as aflições da família do RN prejudicam a receptividade das notícias. Somente uma atividade sistemática de formação permanente pode contribuir para que seja uma atividade bem-sucedida.

Pretendemos, em nosso serviço, sensibilizar e capacitar toda a equipe multidisciplinar na comunicação de notícias difíceis, incentivar a participação dos residentes nessa tarefa e instituir um protocolo específico para esta finalidade.

 

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