Revista de Pediatria SOPERJ

ISSN 1676-1014 | e-ISSN 2595-1769

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Número atual: 21 (supl 1)(1) - Dezembro 2021

Artigo Original

Hospitalizações por diabetes mellitus na infância no Brasil e regiões entre 2010 e 2019

Hospitalizations for diabetes mellitus in childhood in Brazil and its regions between 2010 and 2019

 

Paula Dourado Sousa1; Catherine Castelo Branco de Oliveira2; Daniel Rocha Cavalcante de Farias2; Lis Vinhático Pontes Queiroz1; Amanda Lis Carneiro Patas da Cunha2; Rafaela Góes Bispo2; Lara Lorrayne Freitas Gomes1; Otavio Augusto Gomes2

 

DOI:10.31365/issn.2595-1769.v21isupl.1p16-22

1. Centro Universitário UniFTC, Curso de Medicina - Salvador - Bahia - Brasil
2. Universidade Federal da Bahia (UFBA), Faculdade de Medicina da Bahia (FMB) - Salvador - Bahia - Brasil

 

Endereço para correspondência:

pauladourado95@hotmail.com

Recebido em: 30/06/2021

Aprovado em: 13/07/2021


Instituição: Centro Universitário UniFTC, Curso de Medicina

 

Resumo

INTRODUÇÃO: O diabetes mellitus tipo 1 é uma doença crônica frequentemente iniciada na infância. O diabetes mellitus tipo 2, mais comum em adultos, está aumentando sua incidência em crianças.
OBJETIVO: Investigar o perfil epidemiológico do DM entre crianças e adolescentes no Brasil entre 2010 e 2019.
MÉTODOS: Foi realizado estudo ecológico, em série temporal do tipo descritivo, usando hospitalizações por diabetes mellitus no Brasil e regiões de 2010 a 2019 em indivíduos até 19 anos, usando o Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde.
RESULTADOS: Houve aumento das hospitalizações de 2010 a 2019 de 16,12%. As regiões Sudeste e Nordeste apresentaram o maior número de internação por essa doença; a Nordeste teve o maior aumento relativo das internações no período, com crescimento de 25,56%. A maioria das hospitalizações (57,3%), e as maiores taxas de letalidade (0,74%) e mortalidade (11,64 por milhão) ocorreram no sexo feminino; e as maiores mortalidades, nas regiões Norte e Nordeste: 1,09 e 0,97 por milhão, respectivamente.
CONCLUSÃO: Mulheres jovens (10-19 anos) do Nordeste e Sudeste são as mais acometidas pela doença, porém são necessários mais estudos para compreender melhor as internações nos diferentes grupos estudados.

Palavras-chave: Diabetes Mellitus. Endocrinologia. Criança. Adolescente. Pediatria. Hospitalização.


Abstract

INTRODUÇÃO: Type 1 diabetes mellitus is a chronic disease, generally from early childhood. Type 2 diabetes mellitus, more common in adults, has been increasing its incidence in children.
OBJECTIVE: To investigate the epidemiological profile of diabetes mellitus in children and adolescents in Brazil between 2010 and 2019.
METHODS: Ecological study with descriptive time-series about the hospitalizations for diabetes mellitus in Brazil and its regions from 2010 to 2019, in individuals up to 19 years old, with data available in the Hospital Information System of the Unified Health System.
RESULTS: There was an increase of 16,12% in the hospitalizations from 2010 to 2019. Northeast and Southeast regions presented the highest numbers of hospitalizations for this disease; the Northeast region showed the greatest relative increase in the hospitalizations in this period, with a rise of 25,56%. Most of the hospitalizations (57,3%), and the highest lethality (0,74%) and mortality (11,64 per million) rates occurred in the female sex, and the highest mortality rates occurred in the North and Northeast regions: 1,09 and 0,97 per million, respectively.
CONCLUSIONS: Young women (10-19 years) from the Northeast and the Southeast regions are the most affected by the disease, however more studies are necessary to better understand hospitalizations among the different groups studied.

Keywords: Diabetes Mellitus. Endocrinology. Child. Adolescent. Pediatrics. Hospitalization

 

INTRODUÇÃO

O diabetes mellitus tipo 1 (DM 1) é uma doença crônica que frequentemente se apresenta na infância.1 Em 1985, atingia aproximadamente 30 milhões de pessoas. O número aumentou para 135 milhões em 1995 e 177 milhões em 2000. Até 2025, a previsão é de que esse número chegue a 380 milhões.2 O DM 1 afeta aproximadamente uma em cada 500 pessoas abaixo dos vinte anos de idade, com uma incidência de dez por 100.000 pessoas/ano nesta faixa etária1. Embora o diabetes tipo 1 possa ocorrer em qualquer faixa etária, sua predominância situa-se entre 5 e 15 anos de idade.3

O diabetes mellitus tipo 2 (DM 2), que antes se desenvolvia apenas em adultos, está aumentando com rapidez alarmante, sobretudo entre minorias étnicas. Atualmente, mais de 200 crianças desenvolvem diabetes a cada dia no mundo.2

Como o diagnóstico na criança e adolescente é realizado pelas manifestações clínicas, o primeiro contato da criança ou adolescente diabético com o profissional da saúde costuma envolver uma atmosfera de ansiedade e dúvidas.2 Devido às grandes complicações que o diabetes traz para a vida da criança e de sua família, profissionais de saúde devem estar atentos na identificação das pessoas com risco para essa doença e intensificar as ações para promover seu controle entre os diagnosticados.1

O descontrole dos níveis glicêmicos no longo prazo pode desencadear complicações crônicas micro e macrovasculares, levando a neuropatias e amputações, retinopatias, nefropatias e doenças cardiovasculares que podem ocorrer após entrada na puberdade ou após cinco a dez anos do início da doença.4 Outras complicações sérias são hipoglicemias, hiperglicemia grave e cetoacidose diabética, que, associadas a um controle metabólico deficiente, podem ser a causa das internações hospitalares e mortalidade do paciente com diabetes mellitus.4

As estatísticas globais de morbidade e mortalidade mostram grande impacto econômico em decorrência da elevada frequência de complicações micro e macrovasculares.3 Desta forma, o conhecimento dos fatores de risco pregressos para o desenvolvimento de diabetes mellitus na infância e adolescência é muito importante para detectar os indivíduos de alto risco e tentar intervenções anteriores à fase clínica da doença.3

A partir da importância do diabetes em crianças e adolescentes e a incidência crescente da doença nessa população, o presente artigo tem como objetivo investigar o perfil epidemiológico do DM entre crianças e adolescentes no Brasil entre 2010 e 2019, além de explorar os impactos financeiros para o sistema de saúde.

 

MÉTODO

Realizamos um estudo ecológico, do tipo série temporal, descritivo. Foram selecionados os casos de hospitalizações por DM no Brasil e regiões de 2010 a 2019 em indivíduos de até 19 anos de idade.

Os dados epidemiológicos relacionados ao número de internações foram obtidos do Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde (SIH/SUS), no endereço eletrônico (http://www.datasus.gov.br). Os dados do SIH foram gerados a partir do envio das Autorizações de Internação Hospitalar (AIH) pelos serviços hospitalares conveniados ao SUS para os gestores municipais ou estaduais, sistema administrado pela Secretaria de Assistência à Saúde, juntamente com as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde.

Os dados foram selecionados na modalidade "por local de internação": assim, as hospitalizações de cada região foram computadas segundo a localidade da unidade hospitalar de internação do paciente.

As variáveis estudadas entre as regiões brasileiras incluíram as seguintes características: sexo, faixa etária, caráter do atendimento (eletivo ou urgência) e a taxa de mortalidade por milhão de habitantes. Para o cálculo da taxa de mortalidade, considerou-se como numerador o número de óbitos pela doença, e como denominador, a população estimada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), disponibilizada pelo Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS), vezes um milhão. Além disso, foi verificado o custo médio por internação no país.

Os dados foram apresentados como frequências absolutas e relativas quando fazendo referência a proporções, e média e desvio-padrão quando fazendo referência às variações anuais ou regionais nas variáveis contínuas.

A partir dos dados obtidos no SIH/SUS, foram construídas novas tabelas, por meio do programa Microsoft Word, e gráficos através do Microsoft PowerPoint. Por se tratar de um banco de domínio público, não foi necessário submeter o projeto a Comitê de Ética em Pesquisa.

 

RESULTADOS

De 2010 a 2019, houve um total de 85.021 internações por diabetes mellitus como causa primária em indivíduos entre 0-19 anos em todo o Brasil. A média nacional de hospitalizações por ano no período foi de 8.502,10 (± 429,11). Do primeiro ao último ano, houve um crescimento de 16,12%, sendo que o ano de 2019 apresentou maior número absoluto de internações, com 9.430 notificações. Em relação às regiões brasileiras, a que apresentou o maior número de internações foi a Sudeste, com 44,83% das notificações, seguida da Região Nordeste, com 24,30%. A Região Norte teve o menor número de internações, representando cerca de 5% do total. Dentre as regiões, a Nordeste foi a que apresentou o maior aumento relativo das internações nesse período, com crescimento de 25,56% entre 2010 e 2019. A Região Centro-Oeste foi a única que reduziu o número de hospitalizações no período. A tabela 1 descreve os dados demográficos por DM na infância entre 2010 e 2019 no Brasil.

 

 

Nesse período, a maior parte de internações (57,3%) e óbitos (62,4%) por DM notificados na faixa etária de 0-19 anos ocorreu no sexo feminino. Isso é refletido pela taxa de mortalidade por DM nessa faixa etária, que fica em torno de 11,64 óbitos por milhão de indivíduos do sexo feminino e 6,74 por milhão de indivíduos do sexo masculino. A letalidade também segue o mesmo padrão, com taxa de 0,74%, entre mulheres, e 0,59%, entre homens.

Em relação a raça/cor, 27.691 (32,57%) internações não incluíram essa informação. A cor branca foi a mais comum entre os indivíduos internados, com 27.156 (31,94%) hospitalizações, seguida pelas cores parda, com 26.943 (31,69%) internações; preta, com 2.271 (2,67%) internações; amarela com 890 (1,04%) internações; e por fim, indígena, com 70 (0,08%) internações.

Em média, a taxa de mortalidade anual estimada no Brasil entre 2010 e 2019 foi de 0,91 óbito por milhão de habitantes. O ano de 2017 apresentou a maior taxa do período (1,06 por milhão de habitantes). As regiões que apresentaram maiores taxas de mortalidade anual estimadas foram Nordeste e Norte; e a menor foi a Região Centro-Oeste. O gráfico 1 ilustra a taxa de mortalidade estimada por região.

 


Gráfico 1. Taxa de mortalidade anual média nas regiôes brasileiras por DM infantil no período de 2010-2019.

 

A tabela 2 traz as internações por região, caráter de atendimento, tempo médio de internação custo médio por internação em reais. As internações de urgência, nesse período, foram consideravelmente superiores às eletivas, representando 94,80% de todas as internações. Esse padrão se manteve em todas as regiões do país, variando de 88,73% a 97,94%. Quanto à distribuição das internações por faixa etária, a que apresentou o maior percentual de internação foi a de 10-14 anos, com 36,96%. Seguiram-se as faixas etárias de 15-19 anos, com 31,11%, de 5-9 anos, com 19,06%, de 1-4 anos, com 9,66%, e menor que um ano, com 3,21%.

 

 

Quanto ao tempo médio de permanência na unidade de internamento por DM no período analisado, a Região Nordeste se destacou com o maior tempo entre as regiões. Seguiram-se as regiões Norte, Sudeste, Centro-Oeste e Sul, com a menor média de permanência. Em comparação com a média de permanência nacional, que foi de 5,72 (± 0,63) dias, apenas as regiões Centro-Oeste e Sul apresentaram tempo médio de permanência inferior. Nesta análise, foi observado que a faixa etária de 1-4 anos apresentou o maior tempo médio de permanência hospitalar (7,0 dias). Na tabela 2, há o detalhamento das internações, com o caráter de atendimento, o tempo médio de permanência e o custo-ano (em reais) por região brasileira.

O custo médio por internação no país foi de R$ 746,12 (± 75,63), com aumento de 33,8% entre os extremos do período avaliado. As regiões que apresentaram o maior e o menor custo médio foram o Sul (R$ 855,47 ± 91,69) e o Centro-Oeste (R$ 643,35 ± 98.64), respectivamente. A faixa etária que apresentou o maior custo médio por hospitalização foi a de crianças com menos de um ano de idade (R$ 949,60), seguida pela de 15-19 anos (R$843,15) e pela de 1-4 anos (R$735,74). Já o custo total das internações no país foi de R$ 63.696.593,97, com um aumento de 55,4% entre os extremos do período, sendo a Região Sudeste (R$ 29.070.988,91) e Nordeste (R$ 14.520.051,33) os com maiores gastos, correspondendo percentualmente a 45,6% e 22,8% do total.

 

DISCUSSÃO

No período descrito, houve aumento no número total nacional de internações por DM na faixa pediátrica, fato também relatado em análises brasileira4 e americana.5 Pode-se inferir que tal aumento se deu devido ao alargamento da população nacional, mas se assim for, significa que não houve uma redução importante da taxa de incidência de novas hospitalizações no país. Uma possível justificativa para o fato seria que o Brasil é um país ainda em desenvolvimento e, portanto, ainda muito permeado pela pobreza, e a privação socioeconômica já se mostrou comprovadamente associada a maiores taxas de internações em crianças com DM1.6 Outro fator possível é que nosso sistema de saúde notoriamente hospitalocêntrico seja focado em resolver as complicações agudas ao invés de preveni-las, defeito que também ocorre em outros países7 e que pode afetar negativamente também as taxas de mortalidade.

Com relação ao perfil epidemiológico da população de estudo, observou-se predominância das hospitalizações por DM em crianças e adolescentes entre 10-14 anos de idade. Considerando que a DM tipo 1 corresponde à grande maioria dos casos de DM em crianças e adolescentes,8 tal achado pode ser explicado pelo pico de incidência de diagnósticos desta doença na faixa etária em questão.9 O diagnóstico da DM1 baseia-se em sintomas clínicos típicos e monitorização glicêmica, podendo-se utilizar também de outros parâmetros em caso de dúvida, tais como a presença de autoanticorpos relacionados a diabetes, teste de intolerância à glicose e dosagem de hemoglobina glicada (HbA1c).10 Diante disso, estima-se que até cerca de 65% das crianças com DM1 apresentem a cetoacidose diabética como manifestação inicial,11 correspondendo a uma parcela considerável das hospitalizações por DM nessa idade.

No que se refere ao sexo, os resultados obtidos denotam maior prevalência das hospitalizações por DM em meninas, assim como maior taxa de mortalidade. Nesse contexto, foi demonstrado que o sexo feminino é um consistente fator de risco para o desenvolvimento de cetoacidose diabética,12 complicação aguda mais característica da DM1.11 Considerando que a maioria absoluta das hospitalizações no período foi em caráter de urgência, a preponderância das jovens na principal causa de internações eminentemente necessárias pode explicar o predomínio nesse quesito. A explicação patológica para esse resultado pode se dever ao fato de meninas apresentarem maior resistência insulínica na infância e adolescência,13 o que possivelmente também contribui na taxa de mortalidade mais elevada neste sexo.14 Outros fatores que podem estar envolvidos na maior predominância relativa de óbitos são o pior controle metabólico e maior IMC na curva de peso em indivíduos do sexo feminino,15 que levariam a uma pior evolução da doença e hipoteticamente também poderiam contribuir para maior mortalidade. Essa tendência de mortalidade foi demonstrada em outro estudo brasileiro recente,4 e também em coorte europeia,7 o que ratifica o achado.

Observando as discrepâncias no quesito raça/etnia, os indivíduos negros (pretos e pardos) representaram a maioria dos internamentos nos quais a cor foi computada. É de fato que no Brasil, essa categoria também é a que representa a maioria da população,16 porém já foi comprovado que a DM1 é mais comum em indivíduos brancos.17 O que poderia explicar o fenômeno reportado é que pacientes pediátricos negros tendem a desenvolver mais cetoacidose diabética do que os brancos,18 fato que pode ser parcialmente explicado pelo maior descontrole glicêmico nessa população.19 Além disso, a porcentagem de pessoas negras que vivem abaixo da linha da pobreza no Brasil é mais que o dobro do que no coletivo de pessoas brancas20 e, como já foi dito, fatores socioeconômicos interferem no aumento das hospitalizações nesse contexto.6 Crianças negras também apresentaram maior média de dias de internamento e maior taxa de mortalidade em comparação às brancas, fato já demonstrado em outros estudos21 e que podem ser provavelmente explicados pelos fatores já citados.

Sobre a distinção das causas que levaram aos internamentos por DM1 na infância, apesar do caráter de urgência das hospitalizações, os dados analisados não possuem discriminantes que indicam as principais causas que levam ao desfecho do internamento dos pacientes no Brasil. No entanto, a literatura traz que a cetoacidose diabética e a hipoglicemia são as principais complicações agudas em pacientes com DM1 nessa faixa etária.22,23 Ademais, há ainda uma relação entre o surgimento dessas complicações por diagnósticos tardios, mecanismos regulatórios não completamente desenvolvidos e o uso inadequado da insulina.22

Os resultados obtidos mostram grande variação geográfica nas hospitalizações por DM no período analisado. Sudeste, região com maior número de hospitalizações, apresentou quase nove vezes o número de internações da Norte, com menor número de internações. Em 2018, a Região Norte apresentou a menor distribuição de médicos do país, com 1,16 médico para cada mil habitantes, contrastando com a média nacional de 2,18 médicos por mil habitantes.24 Ainda no mesmo ano, a Região Norte apresentou a menor quantidade de leitos no país, com 5% do número total, o que correspondia a 1,23 leito para cada 10 mil habitantes, contabilizando quase metade da média nacional, que foi de 2,13 leitos para cada 10 mil habitantes.25 Assim, ainda há um acesso desigual à saúde, sendo mais afetadas as áreas menos desenvolvidas, mais distantes e de difícil provimento.26

Ao analisar o tempo médio de permanência hospitalar, pouca variação foi observada de acordo com as diferentes regiões brasileiras, sendo essa média discretamente maior no Nordeste e no Norte, assim como na faixa etária de 1-4 anos de idade. Nesse contexto, um estudo americano demonstrou que viver em situação de pobreza e idades mais jovens são fatores de risco independentes para uma maior média de permanência hospitalar.21 Considerando que, entre os anos de 2012 e 2019, Nordeste e Norte foram as regiões que apresentaram as menores rendas per capita de todo o país,27 o estudo em questão corrobora os resultados encontrados.

Sobre o custo médio de internação, observou-se entre 2010-2019 aumento de 33,8%. Porém, ao realizar uma correção dos custos baseados nos valores de inflação dos serviços de saúde, comparando o ano de 2010 com os demais anos da série, percebeu-se que o custo médio anual ficou abaixo da inflação.

No que tange às limitações do presente estudo, a principal se refere à não distinção quanto ao tipo de DM. Atualmente, sabe-se que há diversos tipos de DM, que podem ser classificados em quatro grupos distintos: DM tipo 1, DM tipo 2, DM gestacional e "outros tipos específicos de DM", estando inclusos neste último indivíduos com defeitos genéticos na função da célula beta ou na ação da insulina, DM associada com outras endocrinopatias e pessoas com disfunção pancreática causada por drogas, substâncias e infecções.28 No entanto, na infância e adolescência, a DM tipo 1 é predominante.8 Embora rara no passado, concomitantemente ao aumento da obesidade em crianças e adolescentes, a incidência de diagnósticos da DM tipo 2 nessa população também tem aumentado, chegando a contabilizar, em algumas populações de estudo, 8,5% dos diagnósticos de DM29.

Outra limitação se deu no estudo da raça dos pacientes: como quase um terço dos indivíduos não teve sua cor/etnia relatadas, a representação dos números que foram informados pode não ter sido fidedigna à população total. Ademais, pelo fato de terem sido utilizados dados secundários, além de os mesmos se encontrarem suscetíveis a erros de codificação de diagnósticos, não foi possível identificar as causas das internações, assim como da presença de comorbidades associadas, que podem ter influenciado no panorama de internações por DM em crianças e adolescentes. Apesar disso, frente à alta prevalência da DM na infância e à escassez de estudos sobre o tema envolvendo a população pediátrica, o presente estudo traz informações acerca da epidemiologia e distribuição regional da doença, trazendo à tona a importância de medidas preventivas e políticas públicas efetivas que promovam a saúde pública em âmbito nacional.

 

CONCLUSÕES

O diabetes mellitus tipo 1 afeta milhões de pessoas e esse valor tende a aumentar. Por conta da alta prevalência e incidência, este estudo visou estabelecer relações epidemiológicas para informar quais indivíduos têm maior probabilidade de desenvolver DM 1. Assim, é visível que as regiões Sudeste e Nordeste são as que apresentam o maior número de internação por essa doença, pois juntas somam quase 70%. Há um predomínio na hospitalização e mortalidade das mulheres. Deve-se ressaltar também que indivíduos de 10-19 anos somam aproximadamente 68% das internações. Portanto, mulheres jovens (de 10-19 anos) das regiões Nordeste e Sudeste são o principal alvo dessa moléstia que custa milhões ao Brasil.

Nessa perspectiva do alto custo, é necessário o estabelecimento de novas pesquisas que demonstrem o motivo pelo qual alguns estados, como os da Região Centro-Oeste, estão se movendo no sentido contrário e vêm conseguindo reduzir o percentual de internações por esse distúrbio.

 

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