Artigo Original
Análise temporal da idade pediátrica em Serviço de Atendimento Móvel de Urgência regional
Temporal analysis of pediatric age in a regional Mobile Emergency Care Service
Sebastião Veloso Silveira1; Olguimar Santos Dias2; Verônica Alcoforado Miranda2; Israel Figueiredo-Jr1
DOI:10.31365/issn.2595-1769.v23i2p41-48
1. Universidade Federal Fluminense, Departamento Materno Infantil - Niterói - Rio de Janeiro - Brasil
2. Serviço de Atendimento Móvel de Urgência -Metropolitana 2 Rio de Janeiro, Departameto de Ensino e Pesquisa - Niterói - Rio de Janeiro - Brasil
Endereço para correspondência:
Recebido em: 12/10/2022
Aprovado em: 29/11/2022
Resumo
OBJETIVO: Realizar uma análise temporal da frequência de grupos etários na população de pacientes de um serviço regional de assistência pré-hospitalar de emergência médica.
MÉTODOS: Estudo transversal de dados inseridos no prontuário eletrônico de um órgão regional no período de 2009 a 2018. A coleta de dados foi realizada na central de controle e despacho médico do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência da 2ª Região Metropolitana do Rio de Janeiro, Niterói, Brasil. Este centro é responsável pelo envio, controle médico e recursos de supervisão em sete municípios. As faixas etárias dos pacientes pediátricos foram plotadas em uma linha do tempo usando o método de média móvel integrada autorregressiva. Os testes não paramétricos foram utilizados para verificar a diferença de médias ranqueadas entre as duas metades do quinquênio de análise, e o teste de Bonferroni, para comparações anuais de idades entre as cidades.
RESULTADOS: Um total de 347.247 atendimentos de pacientes analisados pelo controle médico foram recuperados e a idade do paciente, categorizada. Entre os pacientes menores de 20 anos, 15.982 eram adolescentes (média mensal = 133,18; DP = 65,881), correspondendo a 61,44% dos atendimentos. A análise das médias ranqueadas revelou um declínio acentuado na segunda metade do período de análise em relação à primeira metade para as faixas etárias de interesse (p<0,015).
CONCLUSÃO: A faixa etária de 15-19 anos representou a maioria dos atendimentos de pacientes nesse sistema de emergência. Já a análise temporal demonstrou tendência de leve queda nessa faixa etária na Região Metropolitana do estado do Rio de Janeiro.
Palavras-chave: Grupos etários. Medicina de emergência. Cidades. Assistência pré-hospitalar
Abstract
OBJECTIVE: To carry out a temporal analysis of the frequency of age groups in the patient population of a regional prehospital medical emergency service.
METHODS: Cross-sectional study of data entered in the electronic medical record of a regional body from 2009 to 2018. Data collection was carried out at the control and medical dispatch center of the Mobile Emergency Care Service of the 2nd Metropolitan Region of Rio de Janeiro, Niteroi, Brazil. This center is responsible for dispatch, medical control and supervision resources in seven municipalities. Age groups of pediatric patients were plotted on a timeline using the autoregressive integrated moving average method. Non-parametric tests were used to verify the difference in ranked means between the two halves of the five-year period of analysis, and the Bonferroni test, for annual comparisons of ages between cities.
RESULTS: A total of 347,247 patient visits analyzed by medical control were retrieved and the patient's age was categorized. Among patients younger than 20 years, 15,982 were adolescents (monthly average = 133.18; SD = 65.881), corresponding to 61.44% of the cases. Analysis of ranked means revealed a sharp decline in the second half of the analysis period compared to the first half for the age groups of interest (p<0.015).
CONCLUSION: The 15-19 age group represented the majority of patient care in this emergency system. The temporal analysis showed a tendency for a slight decrease in this age group in the Metropolitan Region of the state of Rio de Janeiro.
Keywords: Age groups. Emergency medicine. Cities. Prehospital care.
Introdução
A medicina de emergência pré-hospitalar vem se efetivando como mais uma porta de entrada do sistema de saúde em várias cidades brasileiras, principalmente quando é um evento de urgência em qualquer ambiente, em via pública ou no domicílio. 1
Esses grupos de profissionais de saúde ligados ao sistema móvel de urgência desempenham um trabalho específico de emergência, que requer não só a capacidade psicomotora como também uma carga horária para treinamentos individuais e em grupo, presencialmente ou não. 2 Esses treinos têm como missão o aprimoramento técnico em situações de emergência, já que os times serão demandados para avaliações de pessoas de qualquer idade, a qualquer hora do dia e em qualquer lugar.
Entretanto, nos encontros técnicos para discussão em grupos dos temas relacionados à assistência pré-hospitalar, fica evidente uma preocupação com o acolhimento de crianças e adolescentes. Os membros da equipe de atuação extra-hospitalar (médicos, enfermeiros, técnicos e condutores) demonstram receio em atender crianças de qualquer idade, muitas vezes em função da necessidade de se estabelecer estimativa de peso, definir taxas de infusão hídrica 3 ou até mesmo avaliar administração de medicamentos com cálculos prévios, 4 sem falar em ventilação mecânica 5 e outras condutas invasivas.
Levando-se em consideração que a identificação da idade da criança é de suma importância para a terapia em situações agudas e tomando-se isso como premissa maior, estipulou-se a hipótese de que o atendimento em menores de 20 anos vem diminuindo com o passar dos anos, acompanhando as observações de queda nos números de ligações e regulações médicas na região analisada.
Portanto, os objetivos deste trabalho foram estudar a evolução temporal do atendimento às faixas etárias pediátricas agrupadas em um serviço médico móvel de urgência regional, além de definir uma tendência para cada grupo etário pediátrico (abaixo de 20 anos) na Região Metropolitana 2-RJ e respectivos municípios.
Método
Desenho do estudo
Trabalho transversal, realizado a partir de relatórios de gestão emitidos pelo técnico responsável pela tecnologia de informação do serviço de socorro médico na assistência pré-hospitalar, em que foi verificado o comportamento evolutivo dos vários grupos etários na região. Projeto aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal Fluminense (CAEE: 00746512.9.0000.5243).
Locais de realização
A coleta de dados foi realizada na central de regulação da coordenação geral regional do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) da região Metropolitana 2-RJ, localizada no município de Niterói, Rio de Janeiro, Brasil. Essa central de regulação médica é responsável por mobilização de recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) em municípios do sstado do Rio de Janeiro. A região Metropolitana 2-RJ é formada por sete cidades: São Gonçalo (1.031.903 habitantes; IDH=0,739), Niterói (495.470; 0,837), Itaboraí (227.168; 0,693), Maricá (143.111; 0,765), Rio Bonito (67.284; 0,710), Tanguá (32.140; 0,654) e Silva Jardim (21.336; 0,654). O município de Niterói é a sede da Central de Regulação Médica de Urgência do SAMU 192. 6
Equipes e fluxo de funcionamento
A Central de Regulação Médica tem como missão aplicar a consulta médica à distância e a incumbência de liberar ou não recursos humanos e materiais para a população da região e de cada município. Essa central é responsável pela gestão de 24 ambulâncias, entre unidades avançadas e básicas, tendo 419 pessoas, entre médicos, enfermeiras, técnicos, condutores e outros profissionais. Todos os dados recolhidos, relacionados ao atendimento por telemedicina e/ou com envio de viaturas, passaram pelo médico regulador antes do encerramento da ocorrência em uma ficha eletrônica no sistema, o que garantiu a qualidade da informação.
Fonte de dados, tamanho do estudo e população-alvo
Essa base de dados encontra-se em um servidor PHP (Hypertext Preprocessor), chamado SR 192 (Sistema de Regulação SAMU 192)®.
O estudo foi realizado levando-se em consideração a alimentação de dados pelos médicos reguladores e pelas equipes dos atendimentos, efetivados em ambiente pré-hospitalar entre março de 2009 e dezembro de 2018. Teve abrangência administrativa de uma região (em torno de 2.100.000 milhões de habitantes), sendo que o município de São Gonçalo contribui com praticamente metade da população regional.
Banco de dados e variáveis
Foram elaborados para o estudo dois bancos de dados extraídos das fichas eletrônicas decorrentes dos eventos que passaram pela central de regulação. O primeiro foi composto por três variáveis numéricas discretas referentes ao total de ligação recebido pelos técnicos de telefonia, ligações atendidas pelos médicos reguladores e atendimentos que tiveram liberação de recursos móveis pela central de regulação.
O segundo banco de dados foi referente à variável idade em menores de 20 anos, que passaram pelo médico regulador, e foi dividida em Neonatal (até 29 dias), Lactente (1mês a 2 anos), Criança I (3 a 7 anos), Criança II (8 a 14 anos), Adolescente (15 a 19 anos). Essa classificação veio de uma categorização realizada pelo Ministério de Saúde do Brasil no início dos anos 2000, com pequenas modificações realizadas pelos gestores locais da época. Cada categoria de idade descrita foi transformada também em uma variável numérica discreta (contagem) e analisada na linha do tempo com repetições mensais, (n= 120). Cada uma dessas variáveis foi analisada em cada um dos sete municípios e também em seu total de ocorrência na região.
Para análise comparativa entre períodos, das 120 repetições (relativas ao número de meses de estudo) foram inseridas mais duas variáveis categóricas: uma relacionada à distribuição anual (12 repetições por cada ano) e a outra à comparação entre as duas metades do período estudado (60 repetições relativas aos anos de 2009 a 2013 e 2014 a 2018).
Método estatístico
Para análise temporal do primeiro banco de dados, as descrições levaram em consideração valores absolutos e relativos, médias aritméticas e ranqueadas, desvios-padrão e intervalos de confiança nos dez anos de análise. Foi utilizado um modelo de regressão no qual, para elaboração da curva de estimação, a variável ano ficou como independente e as variáveis dependentes listadas foram o total de ligações recebidas, o total de casos regulados pelos médicos e o total de casos em que houve o envio de recursos móveis. Antes da aplicação dessa modelagem, foi aplicado o teste de Shapiro-Wilks, que caracterizou uma distribuição normal somente para as duas últimas variáveis dependentes estudadas (casos regulados e aqueles com envio de ambulância). O teste de Spearman (distribuição não normal) ou Pearson (distribuição normal) foi aplicado para verificar correlação entre os grupos etários com a linha do tempo. O melhor traçado da curva de estimação foi escolhido a partir da verificação dos coeficientes de determinação (R2), entendendo-se que os valores próximos de 1 indicam que o modelo proposto foi o mais adequado para descrever o fenômeno. O teste t para amostras independentes foi utilizado para comparar as médias das duas metades do período (primeiros quatro anos - 2009/2013 e os últimos anos - 2014/2018), tendo como variáveis-teste o total de ligações, casos de telemedicina e liberação de recursos, enquanto a variável categórica de agrupamento foram as duas metades dos períodos.
No segundo banco de dados, além da análise descritiva, os principais grupos etários foram plotados a partir do Modelador de Séries Temporais ARIMA, verificando-se as tendências de expectativas futuras de ocorrência até dezembro de 2025 a partir de observações mensais. Esse modelo de previsão autorregressivo de média móvel ficou definido em função da demonstração de uma distribuição não normal dos grupos de idade a partir dos testes de Kolmogorov-Smirnov e QQ-plot. O software foi ajustado para o método em sua forma Expert Modeler, e os gráficos foram programados para exibir os valores observados, as previsões, os valores de ajuste e seus intervalos de confiança. O teste de Spearman foi utilizado para as correlações dos grupos etários com o tempo; e os testes não paramétricos, Mann-Whitney e Kruskal-Wallis, foram os escolhidos para analisar diferença das médias ranqueadas entre a primeira e a segunda metade do período (60 meses) e anualmente (12 meses) das variáveis analisadas (grupos etários). Para o ajustamento de comparações múltiplas (ano a ano), o teste post-hoc de Bonferroni foi o utilizado.
As análises foram desenvolvidas com o programa PC/SPSS 24.0 (IBM SPSS Statistic)®. Todos os testes utilizaram como valor significativo p<0.05.
Resultados
Total regional de ligações e atendimentos
O total de ligações telefônicas recebido pela Central de Regulação dos sete municípios, nos dez anos de estudo, foi de 1.206.684, com uma média/anual de 120.688,40 (IC 95% - 68.381,37 a 172.955,43; DP=73.092,221). Os casos que passaram por médicos reguladores alcançaram um somatório de 347.247 (média/ano= 34.724,00), enquanto os recursos humanos e materiais foram liberados e enviados em 183.846 ocorrências reguladas (média/ano=18.384,60; IC 95% - 14.228,48 a 22.540,72; DP=5.809,858).
Quando confrontados com o tempo, os totais anuais de ligações telefônicas recebidas mostraram uma correlação negativa moderada (r=-,661; p=0,038), semelhante aos atendimentos por telemedicina e sem envio de ambulâncias, que estabeleceram também uma correlação negativa e moderada (r=-0,614; p=0,059). Diferentemente, aquelas ocorrências com envio de recursos mostraram um r-valor positivo e de fraca intensidade (r=0,243; p=0,499).
A análise das médias anuais do total de ocorrências nas duas metades do período (distribuição normal - aplicado o teste t para amostras independentes) mostrou uma diminuição entre o primeiro e segundo período (total de ligações: 163.546,60/77.790,20: p=0,079; total de casos regulados: 49.626,00/28.319,00: p=0,039; e total de casos com liberação de recursos: 18.760,40/18.008,80: p=0,885). Apesar da evolução descendente nas duas metades do período, ficou clara a existência de diferenças significativas somente entre aqueles casos regulados (p=0,018).
Faixas etárias na região e cidades
Dados regionais
Um total de 347.247 atendimentos ocorridos na região que passaram pelo médico regulador foi recuperado e a idade foi categorizada.
Ficou evidente que adultos entre 21 e 60 anos foram os mais atendidos (n=198.907; média/mensal=1.657,56; IC 95% - 1.521,53 a 1.793,59; DP=752,541), seguidos pelos idosos (n=122.328; média/mensal=1.019,40; IC 95% - 966,72 a 1.072,08; DP=291,425) e abaixo de 20 anos (n=26.012; média/mensal=216,77; IC 95% - 195,34 a 238,19; DP=118,517) (Tabela 1).
No grupo com idade entre 15 e 20 anos, ficou definido um quantitativo de 15.982 adolescentes (média/mensal=133,18; IC 95% - 121,27 a 145,09; DP=65,881), que correspondeu a 61,44% dessas ocorrências. Entre as crianças (0 a 14 anos), houve uma frequência decrescente obedecendo à seguinte ordem: crianças entre oito e 14 anos (n= 5.491; média/mensal=45,76; IC 95% - 40,89 a 50,62; DP=26,917), entre um mês e dois anos (n=2.306; média/mensal=19,22; IC 95% - 15,97 a 22,46; DP=17,960), entre três anos e sete anos (n=1938; média/mensal=16,15; IC 95% - 13,41 a 18,89; DP=15,179) e recém-nascidos (entre 0 e 28 dias - n=295; média/mensal=2,46; IC 95% - 2,06 a 2,86; DP=2,211), conforme a Tabela 2. Quando analisadas as médias ranqueadas entre a primeira e segunda metade do período estudado, ficou evidente uma queda acentuada do primeiro para o segundo período em todos os grupos etários, abaixo de 20 anos (p<0,005). Essa queda das médias de ocorrências mostrou-se significativa entre os vários anos, dependendo do grupo analisado: no grupo de crianças abaixo de 29 dias só houve evidência de diminuição significativa entre 2012 e 2014 (p=0,045). Já naqueles entre um mês e dois anos, houve quedas sucessivas significativas entre os primeiros cinco anos da pesquisa e anos subsequentes (p<0,001), apesar de não ter havido diferenças significativas nos últimos quatro anos; no grupo entre 3 e 7 anos, praticamente entre todos os anos houve diferenças significativas ( p<0,005); e entre 8 e 14 anos existiram diferenças significativas entre os primeiros sete anos (p<0,001), mas sem diferenças nos últimos três anos. Quanto aos adolescentes, só não houve quedas significativas nos últimos quatro anos do período, apesar da estabilidade nos últimos dois anos. Modelo parecido foi observado no grupo abaixo de 20 anos, com queda significativa em 2016 e estabilização nos anos subsequentes (Figura 1).
Dados municipais
Houve predomínio, tanto em valores absolutos quanto nas médias de atendimentos, nas faixas entre 15 e 20 anos (n= 15982; 61,44%) e de 8 a 14 anos (n=5491; 21,10%) nos sete municípios. Foi curioso perceber que em cinco cidades a faixa etária de 1 mês a 2 anos ocupou a terceira posição, exceto Itaboraí e Tanguá, onde o grupo etário de 3 a 7 anos ocupou essa posição (Tabela 2).
Somente um município apresentou crescimento anual positivo e não significativo no atendimento em menores de 20 anos, Silva Jardim, representado por coeficientes de r= 0,062; p=0,503. Os outros municípios demonstraram tendência de queda em seus números, semelhantes aos observados no total de ligações e casos regulados.
Quando o volume de atendimento as crianças e adolescentes foi analisado a cada ano, percebeu-se que houve queda significativa nas médias anuais entre o ano inicial e o final do estudo em praticamente todos os municípios, com exceção de Silva Jardim, onde houve crescimento, apesar de quedas entre 2014-2016. Em todas as cidades, houve oscilações, com quedas (2009-2011 e 2014-2016) e ascensão (2012-2013 e 2017-2018) e naqueles municípios de menores populações, as diferenças entre as médias oscilaram menos entre os anos, quase não sendo significativas (Figura 2). Não houve diferenças significativas entre as médias de atendimento nos últimos quatro anos em praticamente todas as cidades. Ainda nos municípios, a partir da análise das médias entre as duas metades do período (2009-2013 e 2014-2019), diferenças significativas de queda entre os períodos ficaram evidentes (São Gonçalo: média 104,56/50,16; MW p<0,0001; Niterói: média 68,45/35,51; p<0,0001; Itaboraí: 33,25/13,40; p<0,0001; Maricá: 31,03/14,63; p<0,0001; Rio Bonito: 20,60/12,78; p<0,0001; Tanguá: 18,28/5,76; p<0,0001; Silva Jardim: 14,18/10,90; p=0,047).
Discussão
Os resultados permitiram entender que, apesar de o atendimento a crianças e adolescentes ter caído de forma significativa entre as duas metades do período, houve leve ascensão nos últimos dois a três anos na maioria dos municípios, sobretudo nos de menores populações. Ficou evidente um percentual de 7,4 % do total de atendimentos abaixo de 20 anos, obtendo-se uma proporção de 1 criança (<14 anos) para 32 adultos e de 1 adolescente (15-20 anos) para 20 adultos atendidos, o que correspondeu a 2,8% de crianças e 4,6% de adolescentes, respectivamente. Os índices encontrados estão muito próximos daqueles evidenciados em trabalho recente, no qual 5,5% foram de crianças abaixo de 16 anos.7
Conceitua-se grupo etário como "agrupamento de indivíduos segundo idade ou faixa etária previamente determinada". 8 Essas divisões da idade são importantes para definição e uniformização de manobras e procedimentos sistematizados em medicina de emergência. Entretanto, as equipes de medicina na assistência pré-hospitalar encontram certa dificuldade na memorização das ações que devem ser adotadas, já que as diversas organizações ou associações promovem categorizações (agrupamentos, faixas) próprias. O protocolo ATLS (Advanced Trauma Life Support), para o delineamento dos dados fisiológicos e condutas na infância, utiliza as classificações etárias: lactente (infant: 0-12 meses); criança pequena (toddler:1-2 anos); criança pré-escolar (preschool: 3-5 anos); e escolar (school: 6-12 anos) e adolescente (adolescent: ≥13 anos). 9 Já o XPHTLS utiliza esta distribuição: recém-nascido (nascimento até 6 semanas), lactente (6 semanas a 1 ano), criança pequena (1 a 2 anos), pré-escolares (2 a 6 anos), escolar (6-13 anos) e adolescente (13-16 anos). 10 O PALS (Pediatric Advanced Life Support), na avaliação de sinais vitais na infância, define as faixas em: prematuro, de 0-3 meses, 3-6 meses, de 6-12 meses, 1-3 anos, de 3 a 6 anos, de 6-12 anos e aqueles maiores de 12 anos; e para a classificação de hipotensão, utiliza outra ordenação: recém-nascido (neonate 0-28 dias), lactente (infants 1 a 12 meses), crianças (children 1 a 10 anos) e crianças (children over 10 y). 11 Até mesmo a Organização Mundial da Saúde (OMS) cria grupos específicos de distribuição etária, dependendo do programa a ser implementado. Como exemplo, pode-se citar o IMCI (Integrated Manejement Childhood Ilness), que para reversão de mortalidade em todo o mundo optou por classificar as crianças em três grupos etários: nascimento -7 dias; 7 dias -2 meses e 2 meses a 5 anos. Mais recentemente, o manual AIDPI Neonatal (nascimento até 2 meses) 12 e o manual ADPI Criança (2 meses a 5 anos) 13 foram reeditados.
Esses são alguns exemplos da dificuldade para administrar ou proporcionar treinamento às equipes envolvidas no atendimento direto à população pediátrica. No entanto, a utilização da idade como fator pontual na análise prospectiva de um serviço de atendimento médico de urgência não é facilmente encontrada na literatura.
Este trabalho mostrou que vem existindo uma oscilação nas médias dos casos abaixo de 20 anos na região, com uma tendência de leve queda até 2025. Talvez esse fato se explique pela certa estabilização no crescimento populacional na região, associado a uma baixa fecundidade das mulheres, taxas praticamente estáveis de nascimentos; e também pelo aparecimento de outras portas de entrada no sistema de saúde para o atendimento dessa faixa populacional, além do trabalho incessante da medicina preventiva. Quando as análises recaem sobre as cidades, percebe-se que aquelas com maiores populações e níveis de IDH mais elevados mostraram declínios mais notáveis desde 2004 do que aqueles com populações menores e IDH mais baixos, esses inclusive mostrando oscilações menores entre os anos de estudo.
Também a análise dos diversos grupos etários na linha do tempo fornece elementos fundamentais para os operadores de saúde e gestores, tanto para previsões de gasto quanto para treinamentos específicos das equipes envolvidas. Estipulou-se, então, que quanto menor o número de atendimentos a determinada faixa etária, maiores serão as dificuldades para um serviço de excelência. Consequentemente, os riscos e complicações para os pacientes sobressaem, já que procedimentos específicos mudam em função da idade e necessitam de treinamento cognitivo e psicomotor. Por isso, um consenso deveria existir e ser utilizado no manejo inicial de crianças e adolescentes seriamente doentes em ambiente hospitalar, tanto para o trauma - XPHTL -, quanto no desenvolvimento para todas as idades, para casos não relacionados ao trauma (casos clínicos) - Modified Early Warning Score (MEWS). 14
As limitações desta pesquisa estão mais uma vez circunscritas na classificação etária diferente das encontradas na literatura e na ausência de trabalhos com métodos estatísticos semelhantes que pudessem permitir uma análise comparativa ajustada. Outra dificuldade foi caracterizar um n de 100% das idades dos pacientes em medicina de emergência pré-hospitalar, já que invariavelmente as vítimas estão desacordadas, sem documentos, indigentes etc.
Concluindo, o trabalho mostrou que o grupo de crianças entre15 e 19 anos foi o prevalente, e a evolução temporal do atendimento a crianças em faixas etárias pediátricas (<20 anos) permitiu demonstrar uma leve tendência de queda para os próximos anos em toda região Metropolitana 2-RJ.
Referências
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